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quarta-feira, 31 de maio de 2023

A CORRUPÇÃO DE ONTEM, DE HOJE E DE AMANHÃ.

 

A corrupção chegou ao Brasil travestida de nepotismo quando Pero Vaz de Caminha pediu a El-Rey que intercedesse em favor de seu genro (condenado por roubo e degredado para a Ilha de São Tomé). Mas a impunidade, velha conhecida dos lusitanos, logo desembarcou no país do futuro que nunca chega. Em 1543, quando o dinheiro para a construção de um aqueduto na cidade alentejana de Elvas acabou antes da conclusão da obra, a comissão parlamentar que auditou a contabilidade concluiu que o desembargador português Pero Borges desviara exatos 114.064 reais (valor correspondente a um ano do seu salário). 


O julgamento se arrastou por anos a fio, mas Borges foi condenado a devolver o dinheiro e proibido de exercer cargos públicos por três anos. Parecia que a justiça havia sido alcançada, mas, 14 meses após a condenação, muito antes do fim do período de punição, o rei promoveu o condenado a ouvidor-geral do Brasil — cargo equivalente ao atual de ministro da Justiça. Em 15 de janeiro de 1549, duas semanas antes de partir para o Brasil, Borges recebeu de sua majestade a promessa de que, "se bem servisse", seria promovido a desembargador da Casa de Suplicação tão logo retornasse ao reino (mais detalhes em A coroa, a cruz e a espada: Lei, ordem e corrupção no Brasil, do jornalista e historiador Eduardo Bueno). Mas a coisa não parou por aí.


Em 17 de janeiro de 1949, El-Rey concedeu a Simoa da Costa, mulher de Borges, uma pensão anual de 40 mil reais a ser paga durante o tempo em que o marido estivesse no Novo Mundo. Para servir no Brasil como ouvidor-geral, Borges embolsava 200 mil reais por ano, mais que o salário nominal de um desembargador do Paço (170 mil reais), e contava com uma dúzia de cupinchas — entre os quais o escrivão Brás Fernandes (40 mil reais por ano) e o meirinho Manuel Gonçalves (20 mil reais anuais). E todos conseguiram receber seus salários antes de zarparem para o Brasil na frota do governador-geral Tomé de Souza, que já se encontrava fundeada no porto, aguardando por eles.

 

Pero Borges é considerado o primeiro corrupto do Brasil. Embora haja dúvidas sobre essa primazia — já que o provedor-mor (como o cargo de ministro da Fazenda era chamado na época) Antonio Cardoso de Barros foi acusado de construir engenhos de açúcar particulares no Recôncavo da Bahia utilizando dinheiro desviado —, a forma como o ouvidor-geral foi escolhido fez dele o primeiro grande exemplo de impunidade da história da história desta republiqueta.

quinta-feira, 30 de julho de 2020

A CULPA É DO CABRAL!


Se nepotismo é uma das muitas facetas da corrupção, então a corrupção desembarcou no Brasil com Cabral (falo do Pedro Álvares, não do ex-governador do Rio), considerando que o escriba Pero Vaz de Caminha, na carta que escreveu a D. Manoel dando conta do “descobrimento”, pediu-lhe que intercedesse em favor de seu genro. E, como reza a sabedoria popular, tudo que começa mal tende a ficar pior.

Observação: O pedido não tratava exatamente de um emprego, mas esse caso se tornou um exemplo lapidar de versão que venceu o fato (volto a esse assunto mais adiante).

Embora tenha ganhado notoriedade a partir de 2014, a Lava-Jato nasceu em 2008, quando uma denúncia levou a PF a investigar o doleiro Alberto Youssef e descobrir que ele presenteara o ex-diretor de abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, com um Range Rover Evoque.

Escusado revisitar os feitos da força-tarefa ao longo dos últimos seis anos e os ataques desfechados contra ela por políticos de alto coturno, cuja intenção, obviamente, sempre foi pôr fim à maior e mais bem-sucedida operação de combate à corrupção da história deste covil de ladrões desde abril de 1500 — cito o ex-senador Romero Jucá, que em 2016 sugeriu ao ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, que uma "mudança" na governo federal resultaria num pacto para “estancar a sangria” .

Observação: Temos um Congresso eivado de corrupção: pelas minhas contas, quase metade dos 81 senadores e mais de um terço dos 513 deputados federais são réus ou investigados no STF e em outras instâncias do Judiciário (depois que a Corte limitou o foro privilegiado dos parlamentares a fatos ocorridos durante o mandato e em decorrência dele, os 11 togados se livraram de um sem-número de processos).

Diante do bombardeio da Vaza-Jato, do empenho da banda podre do Supremo — cito entre vários a alteração da jurisprudência sobre prisão em segunda instância e o prodígio de prestidigitação jurídica com que sete ministros tiraram da cartola a anulação de sentenças em processos nos quais réus delatados não apresentaram memoriais depois dos delatores — e do fato de Bolsonaro ter ignorado a lista tríplice do MPF e nomeado PGR um pau-mandado subserviente e claramente disposto a blindá-lo e a seus filhos enrolados com a Justiça, não surpreende (embora seja preocupante) que as tentativas de desmonte comecem a surtir efeito.

A equipe de Curitiba, coordenada por Deltan Dallagnol, enfrenta críticas não só externas, mas também vindas do próprio Augusto Aras. Há entre os procuradores a certeza de que o PGR quer centralizar as investigações sobre corrupção e, por determinação extraoficial do Palácio do Planalto, desconstruir a imagem do ex-juiz Sergio Moro, símbolo maior da Lava-Jato e que pode dar trabalho ao morubixaba da tribo nas eleições presidenciais 2022. Aliás, o início da disputa entre PGR e a força-tarefa de Curitiba coincidiu justamente com a saída traumática de Moro do ministério da Justiça.

A situação se agravou ainda mais diante de suspeitas de que a força-tarefa de Curitiba teria usado equipamento de gravação e interceptação telefônica de forma ilegal. O ministro Bruno Dantas, do TCU, determinou a realização de diligências para apurar as denúncias — que Dallagnol nega; segundo ele, são apenas aparelhos de gravação de chamada adquiridos em 2015 devido às ameaças sofridas pela equipe, sendo que os próprios servidores controlavam os registros.

A demolição da Lava-Jato conta com os préstimos do próprio presidente, que durante toda a campanha empunhou o estandarte da anticorrupção (promessa avalizada pela escolha de Moro para chefiar a pasta da Justiça) e depois enfiou-o em local incerto e não sabido, mas certamente onde o sol não bate.

As tintas da lisura com que o capitão das trevas tentou disfarçar sua imagem de mau militar e parlamentar medíocre não resistiram à primeira chuva. No entanto, seus apoiadores de raiz insistem no ramerrão de que “neste governo não existe denúncia de corrupção”, como fizeram (e ainda fazem) as toupeiras que não têm olhos e, portanto, não enxergam os atos antirrepublicanos que resultaram na condenação de Lula a mais de 25 anos de cana, somadas as penas resultantes dos dois processos julgados até agora. Aliás, Bolsonaro e Lula não só se retroalimentam como se merecem

Ao atacar a Lava-Jato de maneira injustificada e sórdida, Aras presta um duplo favor a seu chefe: por um lado, agrada ao centrão; por outro, desgasta Moro, de quem o capitão se borra de medo de ter de enfrentar na campanha presidencial de 2020.

Com sua atitude, Aras deixa seus concorrentes para o assento de Celso de Mello no STF, que ficará vago em novembro, comendo poeira, além de prestar um substancial desserviço ao à República da qual é Procurador-Geral, ao Ministério Público Federal, do qual é a autoridade máxima, e às causas do combate à corrupção e da restauração da moralidade pública. 

Não deixa de ser irônico que o candidato Bolsonaro tenha sido o que mais jurou defender a Lava-Jato e o presidente eleito Bolsonaro venha a ser justamente aquele que irá a enterrar a operação. Ainda que isso só surpreenda os cebos e abobalhados de plantão.

Continua na próxima postagem.

quinta-feira, 17 de agosto de 2023

TEORIAS DA CONSPIRAÇÃO — PARTE 11

 
A rotina de baixezas ilícitas, aliada à ofensiva golpista reiterada verbalmente por Bolsonaro e materializada por seus seguidores em 8 de janeiro, caminha para mais dia, menos dia levá-lo à prisão, pois o processo investigativo que atua para desvendar o conjunto da obra destrutiva, erigida num governo que segundo avaliação da PF abrigou uma "organização criminosa", fecha o cerco sobre o ex-presidente. Não como mártir, mas na figura do algoz. 

Os investigadores não diriam ter certeza do envolvimento dele no desvio de bens públicos se não tivessem elementos para isso, mesmo antes da conclusão do inquérito das milícias digitais, que vem de revelar um esquema para "passar nos cobres" presentes valiosos destinados ao Estado brasileiro. Se o Supremo autorizar, ele vai depor novamente na PF e terá seus sigilos bancário e fiscal quebrados, assim como os de sua mulher. Daí para uma operação de busca e apreensão é um pulo nesse tipo de andar das carruagens.

Em escândalos envolvendo altos personagens da República, primeiro são mapeadas as malfeitorias do entorno até a obtenção de fundamentos que impliquem o chefe. No caso PC, no mensalão e no petrolão, no entanto, houve mais complexidade para o desvendamento dos crimes. Agora, o que vemos é um volume imenso de provas produzidas pelos investigados, cujos comportamentos obtusos demonstram que as aparências não enganam. São o que são. 

Do abuso de poder, das urdiduras antidemocráticas ao badernaço golpista, passando pelas sabotagens e fraudes no trato da pandemia, chegamos à rapinagem das joias. Tudo registrado em palavras e imagens que Bolsonaro, para se livrar, precisa provar que só ele não viu.

Com Dora Kramer.

Jacó Bittar, que foi líder dos petroleiros de Paulínia (SP), cofundador do PT e prefeito de Campinas (SP), emprestou a Lula um apartamento em São Bernardo do Campo (SP). Seu filho, Fernando Bittar, era um dos donos (pelo menos no papel) do Sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP), que Lula passou a frequentar depois que deixou o Palácio do Planalto — e para o qual mandou levar caixas e mais caixas com pertences (seus e de familiares). 


Observação: Numa entrevista a Veja em 2016, o delegado federal Igor de Paula disse que "numa perícia minuciosa feita no sítio não foi encontrado um item sequer pertencente a alguém que não fosse da família de Lula; tudo que estava lá era dele, incluindo camisetas e canecas com o escudo do Corinthians e uma série de fotografias de parentes". Mas isso é outra conversa.

 

Antonio da Costa Santos, vulgo Toninho, filiou-se ao PT em 1981 e foi secretário de Finanças da Prefeitura de Campinas sob Bittar. Ardoroso inimigo da especulação imobiliária, empenhou-se na luta pela reurbanização de favelas na sua cidade natal. Antes de chegar à prefeitura, passou a ser conhecido como Toninho13 e foi escolhido pelos núcleos de base do partido para ser o vice na chapa encabeçada por Bittar. Já como prefeito, erradicou a corrupção que seus antecessores mantinham com empresas de ônibus e de coleta de lixo.

 

Ao descobrir que o gestão de Bittar em nada diferia de outras gestões condenadas pelos petistas por causa da corrupção, Toninho fez denúncias e moveu ações populares contra empreiteiras por superfaturamento. Juntou a documentação que havia colecionado e foi procurar Lula, de quem recebeu a promessa de que o caso não ia ficar por isso mesmo. 

 

Toninho se tornou persona non grata aos olhos de Bittar e da alta direção petista. Foi afastado do cargo e perdeu uma eleição, mas nunca deixou de lutar contra a especulação imobiliária. Conseguiu se eleger prefeito em 2000 com apoio pessoal de Lula, mas só ficou na prefeitura por oito meses e dez dias. Em setembro de 2001, foi alvejado três vezes quando deixava o estacionamento de um shopping center em Campinas e morreu no local. O crime nunca foi devidamente esclarecido.

 

A polícia estadual, então sob administração tucana, concluiu que o autor dos disparos fora Wanderson de Paula Lima, conhecido como Andinho, que era chefe de uma quadrilha de sequestradores. A versão dos agentes, chancelada pelo Ministério Público, foi a de que a vítima prejudicou a fuga da quadrilha com uma manobra infeliz (vale destacar que a família nunca aceitou essa narrativa). Outra hipótese levantada pela polícia foi a de que Toninho havia engravidado uma jornalista — o zelador do prédio onde ela morava disse ter visto o político agredi-la porque ela queria ter o filho (que nunca apareceu). 


Para Roseana Garcia, viúva de Toninho, assassinato se deveu ao fato de o marido ter contrariado interesses de "gente graúda", aí incluídas figuras importantes na história do PT. Mas afirmou desconhecer qualquer esquema destinado a cobrar propina de empresários de Campinas para abastecer futuras campanhas eleitorais, inclusive a de Lula. Ela disse ainda que o inquérito foi mal, que foi intimidade durante o processo e que os policiais fizeram de tudo para convencê-la a se dar por satisfeita com a hipótese de crime comum. Diante de sua negativa, seu advogado abandonou o caso.


Andinho, réu confesso de muitas mortes, jamais reconheceu ter matado Toninho. Em setembro de 2007, o presidente do tribunal do Júri de Campinas rejeitou o pedido do MP-SP para levá-lo a julgamento, alegando que não havia provas suficientes para tanto. Ele foi o único sobrevivente dos quatro integrantes do bando cuja fuga teria sido atrapalhada pelo carro do político após uma suposta tentativa de sequestro feita a dois quilômetros do local do crime. Os outros três criminosos morreram em duas ações policiais, uma das quais em Caraguatatuba (litoral norte de SP), na qual foram executados por policiais de Campinas numa operação clandestina. 


Observação: Andinho foi recolhido a uma penitenciária de segurança máxima e condenado a mais de 100 anos de prisão pelo conjunto da obra. A defesa apresentou registros de rastreamento do celular, comprovando que, no momento dos disparos, seu cliente estava a 77 quilômetros do local. Além disso, a arma do crime nunca foi encontrada.


Em campanha pela presidência (e ciente da popularidade do correligionário assassinado), Lula assumiu em palanque o compromisso de que a Polícia Federal, que seria posta sob o comando do advogado Márcio Thomaz Bastos, "não deixaria impunes os assassinos de  Toninho do PT". Mas o pedido feito por Tarso Genro para honrar a promessa do chefe não avançou um milímetro depois que chegou à PGR, em fevereiro de 2008. 

 

Nenhuma das hipóteses levantadas pela viúva foi investigada para valer: os especuladores imobiliários, os chefões do crime organizado e os empresários de ônibus e da coleta municipal de lixo continuaram insuspeitos. A polícia paulista, à época sob o comando do tucano Geraldo Alckmin, recorreu a acusações injuriosas de adultério, paternidade irresponsável, pressão para a parceira ilícita abortar e até homossexualismo contra a vítima. 

 

No Palácio dos Jequitibás, sede oficial da prefeitura de Campinas, de onde geriu a cidade por 8 meses e 10 dias depois de ter sido eleito com 60% da preferência do eleitorado, Toninho é oficialmente lembrado com a frase alardeada pela campanha LULA LIVRE: "Os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas não conseguirão deter a Primavera".

terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

UMA PIADA CHAMADA BRASIL

 

O Brasil, também conhecido como "o país do futuro que tem um longo passado pela frente', é uma piada desde os tempos de Cabral. Despida do glamour fantasioso atribuído pelos historiadores, a Proclamação da República foi o primeiro de dezenas de golpes de Estado político-militares — como a revolução de 1930, a implantação do Estado Novo, a deposição de Getúlio e o golpe de 1964, entre outros. 

Dos trinta e tantos brasileiros que ascenderam à Presidência via voto popular, eleição indireta, linha sucessória ou golpe de Estado nos últimos 134 anos, oito foram apeados do cargo, começando pelo protagonista do golpe que substituiu a monarquia constitucional parlamentarista do Império pelo presidencialismo republicano e se tornou o primeiro presidente do Brasil. Temeroso de ser deposto pelos adversários, Deodoro da Fonseca vetou a Lei do Impeachment. Quando o veto foi derrubado, simplesmente dissolveu o Congresso, como se o país ainda estivesse no Império e ele, Deodoro, fosse o imperador.
 
Da redemocratização até os dias atuais já tivemos um presidente eleito indiretamente que morreu sem receber a faixa
, um literato meia-boca, um pseudo caçador de marajás, um baianeiro namorador, um tucano de plumas vistosas (por dois mandatos) um desempregado que deu certo (por dois mandatos) um poste fantasiado de "gerentona" (por um mandato e meio) um vampiro escalafobético (por meio mandato) um mix de militar ruim e parlamentar pior (por intermináveis 4 anos) e — ói nóis aqui traveiz —  o ex-presidiário mais famoso de Pindorama desde o genro de Caminha, que foi conduzido por togas supremas da carceragem da PF para o gabinete presidencial no DF. 
 
Incapaz de aprender com os próprios erros, o inigualável eleitorado tupiniquim tende a repeti-los eleição após eleição. Ao que tudo indica, teremos neste ano mais um pleito plebiscitário, com postulantes à prefeitura de quase 5.600 municípios apadrinhados por Bolsonaro ou por Lula — parece até coisa de Superman x Lex Luthor ou de Coringa x Batman. E ainda dizem que Deus é brasileiro!
 
Nossos políticos se elegem para roubar e roubam para se reeleger. A fé no Executivo se perdeu antes mesmo de renúncia de Jânio pavimentar o caminho para o golpe de 1964 e os subsequentes anos de chumbo. A chama da esperança foi avivada pelos movimentos pró-diretas, bruxuleou com a rejeição da emenda Dante de Oliveira, voltou a brilhar com eleição indireta de 1985 e foi sepultada com o corpo do primeiro presidente civil da "Nova República" 
 que, a exemplo da Viúva Porcina no folhetim global Roque Santeiro, foi sem nunca ter sidoEm 1989, a vitória de Collor sobre Lula pareceu ser uma luz no fim do túnel. Mas logo se percebeu que o Rei-Sol era tão demagogo e populista quanto adversário derrotado. E o resto é história recente. 

Promovido de vice a titular graças ao impeachment do primeiro presidente eleito pelo voto direto desde 1960, Itamar Franco — que conquistou seus 15 minutos de fama ao ser fotografado com a modelo sem calcinha Lilian Ramos — nomeou Fernando Henrique ministro da Fazenda. Nas pegadas do sucesso do Plano Real, o autoproclamado primeiro-ministro informal derrotou Lula em 1994. Picado pela mosca azul, FHC comprou a PEC da Reeleição e tornou a derrotar Lula em 1998 (também no primeiro turno). Mas já não lhe restavam coelhos na cartola.

Em 2002, Lula foi eleito presidenteA reboque de sua vitória, vieram o Mensalão, o Petrolão e a indicação de oito ministros para o STF. As decisões teratológicas dos togados fulminaram a confiança que os brasileiros haviam depositado no Judiciário quando perceberam que nada de bom viria do Executivo e do Legislativo. Em 2012, o país assistiu estarrecido — mas esperançoso — à condenação da alta cúpula do Mensalão; em 2016, comemorou o impeachment da "gerentona de festim". Na sequência, os avanços da Lava-Jato refrearam em alguma medida e por algum tempo o apetite pantagruélico da politicalha corrupta pelo dinheiro dos contribuintes. Mas não há nada como o tempo para passar.
 
A morte é anterior a si mesma. Ela começa antes da abertura da cova e percorre um lento processo. A Lava-Jato morreu sem colher os devidos louros. Foi graças a ela que, pela primeira vez desde a chegada das caravelas, poderosos da oligarquia política e econômica do Brasil foram investigados, processados e condenados. Seu
 velório reuniu gente importante. Seguravam a alça do caixão Jair Bolsonaro, o Centrão e o PT. O STF enviou uma sequência de coroas de flores enquanto preparava a última pá de cal. Que não demorou a chegar. Ironicamente, o sepultamento se deu sob a égide do presidente que, quando candidato, prometeu pegar em lanças contra a corrupção e os corruptos. Mas vamos por partes.
 
Em 2018, era imperativo impedir
 a volta do lulopetismo corrupto — que se estendeu por 13 anos 4 meses e 12 dias e "terminou" com o afastamento da gerentona de araque. Dada a possibilidade de o país vir a ser governado pelo bonifrate do então presidiário mais famoso do Brasil, a minoria pensante do eleitorado teria votado no próprio Capiroto. Com essa opção não estava disponível nas urnas, o jeito foi apoiar o "mito" da direita radical. Como se costuma dizer, situações desesperadoras requerem medidas desesperadas. 

Somada a uma inusitada conjunção de fatores, o antipetismo ensejou a vitória uma combinação mal ajambrada de ex-militar tosco, truculento e de viés terrorista e parlamentar medíocre (em quase três décadas no baixo-clero da Camara, o dito cujo aprovou míseros dois projetos e obteve míseros 4 votos quando disputou a presidência da Casa, em 2017. E deu no que deu: Bolsonaro se revelou o pior mandatário desde Tomé de Souza, e só não foi expelido do cargo porque contava com a subserviência de um antiprocurador-geral — comprada com a promessa jamais cumprida de uma cadeira no STF) e de um presidente da Câmara conivente  graças ao abjeto orçamento secreto.
 
Observação: O lulopetismo corrupto foi o agente catalizador que levou ao poder o patriarca do clã das rachadinhas e das mansões milionárias, mas foi sua abominável gestão que libertou da catacumba o xamã da petralhada. Se o verdugo do Planalto não conspirasse diuturnamente contra a democracia, não se associasse ao coronavírus, não investisse contra a imprensa, o Congresso e o STF e não andasse de mãos dadas com QueirozZambelli, milicianos, Collor et caterva, talvez o 
pontifex maximus da seita do inferno ainda estivesse gozando férias compulsórias na carceragem da PF em Curitiba.  
 
Com ensinou o Conselheiro Acácio (personagem do romance O Primo Basílio, do escritor português Eça de Queiroz), as consequências vêm sempre depois. E não há nada como o tempo para passar. Em 2022, o fiasco da folclórica "terceira via" levou a mesma minoria pensante que ajudou a eleger o "imbrochável imorrível incomível" em 2018 a apoiar o demiurgo de Garanhuns (alguns até levaram fé na falaciosa frente ampla pró-democracia, mas isso é outra conversa). E deu no que está dando.
 
Reconduzido ao trono com a menor diferença de votos entre candidatos à Presidência no segundo turno desde a redemocratização, o morubixaba petista age como se tivesse sido eleito para o cargo de Deus. Sem se dar conta de que já não esbanja carisma como em 2010, quando se ufanava de ser capaz de eleger até poste, parece confundir o Planalto com o Olimpo da mitologia grega. Livrarmo-nos de Bolsonaro era imperativo, mas a volta de Lula et caterva foi um preço alto a pagar.
 
Não era de esperar que o ex-presidiário multirréu descondenado por togas camaradas cumprisse suas promessas de campanha. Noves fora a de "não descansar enquanto não foder Sergio Moro", naturalmente. E agora a oportunidade lhe bate à porta: o TRE-PR adiou o julgamento do pedido de cassação do ainda senador sob o pretexto de que, para o caso ser analisado, é preciso que o quórum esteja completo. Detalhe: cabe a Lula escolher um dos três nomes homologados pelo Tribunal para a vaga aberta no último dia 27 com a saída de Thiago Paiva dos Santos, representante da classe dos juristas. Mas isso também é outra conversa.
 
No debate promovido pela Band em outubro de 2022, por exemplo, Lula trombeteou que "nomear amigo e companheiro para o Supremo é retrocesso" (referindo-se a Nunes Marques e André Mendonça, indicados por Bolsonaro para as vagas de Celso de Mello e Marco Aurélio). Eleito, indicou o amigo e advogado particular Cristiano Zanin para o lugar de Rosa Weber e Flávio Dino para o de Ricardo Lewandowski, convocou o ex-togado para substituir Dino no comando do ministério da Justiça, e ainda teve o desplante de negar sua relação de amizade com Zanin — que esteve em seu casamento com Janja e a quem chamou de "amigo" em entrevista à BandNews FM.
 
O indicador de corrupção da Transparência Internacional apontou que o Brasil perdeu pontos na luta contra a corrupção sob Bolsonaro e continua descendo a ladeira sob Lula. Com 36 pontos numa escala de 0 a 100, o país despencou da 94ª para a 104ª posição entre os 180 avaliados, ficando atrás da Argentina, da Guiana e da Colômbia, abaixo da média global (43 pontos) e muito abaixo da média entre os membros da OCDE (66 pontos). 
 
A ONG registra que marcos legais e institucionais anticorrupção que demoraram décadas para ser construídos ruíram em poucos anos. Que a indicação de Zanin para o STF foi "contrária à autonomia do Judiciário", e que a de Dino teve "perfil político" para um tribunal já excessivamente politizado. Que a não observância da lista tríplice do MPF na indicação de Paulo Gonet para a PGR evidencia que Lula optou por adotar o mesmo método de escolha política usado por Bolsonaro, cujos efeitos desastrosos ainda são sentidos no país. Que o afrouxamento da Lei das Estatais contou com a cumplicidade do Judiciário — foi uma liminar de Lewandowski que suspendeu os efeitos da lei —, e que houve pressões do governo federal e do Congresso para viabilizar indicações políticas (vale lembrar que o foco das investigações da Lava-Jato foi justamente a corrupção na Petrobras). 

O relatório aponta ainda que Lula herdou de Bolsonaro um Centrão mais poderoso e famélico por recursos do Erário (via "fundão eleitoral", emendas parlamentares etc.), e que, quando o STF ter decretou a inconstitucionalidade do "orçamento secreto", Executivo e Legislativo se uniram para preservar o mecanismo espúrio de barganha e os velhos vícios do esquema da gestão anterior. Que o CNJ rejeitou uma resolução para regulamentar a participação de juízes em eventos privados, palestras e atividades acadêmicas, e o Supremo considerou inconstitucional a regra que ampliava as restrições à atuação de juízes em processos de clientes de escritórios de advocacia onde seus familiares trabalham. 
 
Como desgraça pouca é bobagem, o ministro Edson Fachin driblou o regimento da Corte para entregar o "caso Vaza-Jato" diretamente ao colega Dias Toffoli, que não só anulou todas as provas obtidas com o acordo de leniência da Odebrecht (em todas as esferas e para todas as ações) e suspendeu o pagamento de R$ 3,8 bilhões (valor que chegaria a R$ 8,5 bilhões ao final dos 23 anos previstos para o parcelamento). Em sua decisão, o magistrado anotou que, diante das informações obtidas até o momento no âmbito da Operação Spoofing, teria havido conluio entre o então juiz Sergio Moro e procuradores da Lava-Jato em Curitiba para a "elaboração de cenário jurídico-processual-investigativo que conduzisse os investigados à adoção de medidas que melhor conviesse a tais órgãos, e não à defesa em si". 
 
Observação: A alegação de que o processo foi maculado pela falta de acordos de colaboração internacional não se sustenta, quando mais não seja porque as planilhas de propina, extratos bancários, e-mails e registros de retirada de dinheiro foram fornecidos voluntariamente pela Odebrecht. A empresa alegou que fechou o acordo sob coerção, mas não pediu sua anulação — para não perder benefícios como a permissão para voltar a disputar obras públicas e receber empréstimos de bancos estatais, além da garantia de que não seriam mais processadas pelos crimes já confessados. 
 
A liminar do Maquiavel de Marília colocou a Odebrecht no melhor dos mundos, pois ela não terá de pagar mais nada e não perderá os benefícios recebidos. Quem deixa de ser compensado por anos de corrupção bilionária — que nem a empreiteira nem o nobre ministro negaram ter existido — são o Estado e o contribuinte brasileiro. Para piorar, a fila de empresas que querem se livrar de multas bilionárias vem crescendo, já que podem contar com Toffoli e sua noção sui generis de proteção do Estado de Direito.
 
Triste Brasil. 

EM TEMPO: Toffoli determinou que a Transparência Internacional seja investigada por supostamente se apropriar indevidamente de recursos públicos na época da Lava-Jato. A decisão se deu no âmbito de uma notícia-crime apresentada pelo deputado federal petista Rui Falcão, que questiona a cooperação firmada entre o MPF e a organização nos anos da força-tarefa. O ministro diz tratar-se de uma instituição privada, "alienígena" e "com sede em Berlim" que teria recebido valores que, na verdade, deveriam ter sido destinados ao Tesouro Nacional, como previsto pelas normas legais do país. Para surpresa de ninguém, procuradores envolvidos nas tratativas também devem ser alvo dos procedimentos. Em nota pública, a ONG classificou como falsas as informações e afirmou que o memorando que estabeleceu a cooperação expirou em 2019, e que "tais alegações já foram desmentidas diversas vezes pela própria Transparência Internacional e por autoridades brasileiras, inclusive pelo MPF, mas, apesar disso, tais fake news vêm sendo utilizadas há quase cinco anos em graves e crescentes campanhas de difamação e assédio à organização". Fica nítida em mais essa decisão a intenção do Maquiavel de Marília de se reaproximar de Lula. Quousque tandem, Cunha, abutere patientia nostra?