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segunda-feira, 24 de outubro de 2022

SEM COMENTÁRIOS!



ATUALIZAÇÃOA resistência armada de Roberto Jefferson à prisão descortinou uma visão antecipada da invasão do Capitólio versão tupiniquim, e forçou o Bolsonaro a repetir na sabatina da Record, horas depois da rendição do criminoso, o que havia anotado nas redes sociais: "É bandido". Ecoando ataques do mandatário a magistrados, o pajé do PTB firmou-se como adepto da tese presidencial de que "o povo armado jamais será escravizado", mas atirou prematuramente, num instante em que o presidente tenta virar votos para não ter que virar a mesa. Na mesma postagem em que repudiou as granadas e os tiros, Bolsonaro atacou os "inquéritos sem nenhum respaldo na Constituição". Criticou Jefferson por chamar Cármen Lúcia de prostituta, mas atacou a censura imposta pelo TSE à Jovem Pan, com o voto da ministra. Tenta tomar distância de Jefferson, acomodando no colo de Lula o delator e beneficiário da corrupção do mensalão, mas segue dizendo que as FFAA estão buscando "possíveis fraudes" em urnas que jamais foram fraudadas. Quer dizer: mesmo ciente de que precisa fazer pose de moderado, o presidente manuseia retoricamente as mesmas armas de Jefferson.

A censura é um câncer e como tal pode gerar metástase. Gazeta do Povo foi proibida de publicar que Lula e Daniel Ortega são aliados políticos e admiradores um do outro. Por achar que isso poderia lhe custar votos, o petralha recorreu ao tribunal e foi prontamente atendido. A partir daí o câncer se espalhou pela Jovem Pan  que puxa o saco do candidato à reeleição de forma acintosa, mas daí a ser proibida de falar sobre os processos e as condenações de Lula por corrupção e lavagem de dinheiro vai uma longa distância. É como se não tivesse existido a Lava-Jato ou as férias forçadas de 580 dias que o demiurgo de Garanhuns gozou em Curitiba, ou, ainda, a devolução em massa de dinheiro roubado. 

Nunca se viu numa eleição brasileira — nem mesmo durante o AI-5 — atos de ditadura como os que vêm sendo praticados neste momento pelo alto Poder Judiciário, anotou J.R. Guzzo. Em outras palavras, a Justiça Eleitoral está agindo abertamente a favor de um candidato em detrimento do adversário. 

Ainda segundo Guzzo, montou-se uma colossal operação de fingimento para salvar o Brasil do “autoritarismo”. A metástase transbordou do seu foco inicial não apenas quanto aos órgãos de imprensa perseguidos pelo TSE, mas também em relação aos assuntos censurados. O presidente da corte eleitoral e seus aliados proíbem a exibição de vídeos em que Lula diz ”ainda bem” que “a natureza” nos mandou a Covid — assim as pessoas aprendem a “importância do Estado”. 

É proibido dizer que Lula foi o mais votado nas penitenciárias, e que, na prática, o PT votou contra o Auxílio Brasil. Nem o ex-decano do STF, ministro Marco Aurélio Mello, pode falar: seus ex-colegas proibiram que ele diga que Lula não foi absolvido em nenhum momento, que apenas teve seus processos “anulados” sem quaisquer menções a provas ou fatos, o que não tem absolutamente nada a ver com “absolvição”. E por aí se vai, com multas de R$ 25 mil por dia para veículos de imprensa ou para jornalistas que não obedecerem de imediato as ordens da censura — um abuso sem precedentes na história da justiça brasileira.

Mudando de um ponto a outro, mesmo em país onde o rabo abana o cavalo e o poste mija no cachorro causa estranheza ver Sergio Moro assessorando BolsonaroNas redes sociais, o ex-ministro disse que reatou com o presidente "pelo Brasil, contra a corrupção da democracia e o projeto de poder de Lula e a favor de um país com o mínimo de integridade".
 
Como juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Moro condenou Lula a 9 anos e 6 meses de prisão no caso do tríplex no Guarujá. Quando a sentença foi confirmada pelos desembargadores da 8ª  Turma do TRF-4 (que aumentaram a pena em quase 5 anos), o petista foi preso numa cela VIP em Curitiba.  
Como as eleições gerais de 2018 ocorreram nesse entretempo, não faltou quem acusasse o magistrado de agir de caso pensado, sobretudo depois que ele aceitou o convite do então presidente eleito para integrar seu ministério.
 
Em abril de 2020, Moro desembarcou do governo e acusou o mandatário de tentar interferir na Polícia Federal. "Quando vi meu trabalho boicotado e quando foi quebrada a promessa de que o governo combateria a corrupção, sem proteger quem quer que seja, continuar como ministro seria apenas uma farsa", disse ele. Mas não há nada como o tempo para passar.
 
Moro tinha uma biografia respeitável, estabilidade no emprego, um olho na suprema toga e outro no trono do Planalto. Mas iniciou seu périplo pelos nove círculos do inferno ao trocar a magistratura pela subordinação a Bolsonaro. E o problema com as consequências é que elas sempre vêm depois.

Fritado pelo presidente, Moro fez pose de terceira via; tostado pelo STF, migrou para a condição de antifenômeno eleitoral; esvaziado pelo Podemos, migrou para o UB — e foi forçado a abrir mão da pretensão presidencial para disputar uma vaga de Senador pelo Paraná, que ele efetivamente conquistou.
 
Tomado pelas sentenças que proferiu como juiz, Moro achava que a política era a segunda profissão mais antiga do mundo. Como político, descobriu que ela é muito parecida com a primeira. E se tornou uma cópia carbono do que Alckmin se sujeitou a ser para Lula — a diferença é que o ex-tucano disputa a vice-presidência na chapa do candidato que ele próprio classificou como "o criminoso que quer voltar à cena do crime", enquanto o ex-magistrado reatou com Bolsonaro para não ficar isolado politicamente.
 
Moro continua acusando Lula de mentir, especialmente no que tange aos episódios de corrupção. Mas parece ter mudado de ideia sobre o que via como mentiras do seu mais recente amigo de infância. "Bolsonaro admitiu que nunca defendeu o combate à corrupção e a Lava-Jato. Era só mais um discurso do seu estelionato eleitoral", postou ele em janeiro deste ano. E, três meses depois: "Assim como Lula, Bolsonaro mente. Nada do que ele fala deve ser levado a sério. Mentiu que era a favor da Lava-Jato, mentiu que era contra o Centrão, mentiu sobre vacinas, mentiu sobre a Anvisa e o Barra Torres e agora mente sobre mim. Não é digno da Presidência".
 
Escândalos da carreira política de Bolsonaro também entraram na mira do ex-juiz em determinados momentos: "Sério que, entre um ladrão de um lado e um ladrão do outro, a culpa é do juiz? Entre o petrolão e a rachadinha, não há escolha possível. Precisamos, sim, reformar nosso sistema de justiça para que casos de corrupção não fiquem impunes", postou Moro, quando ainda mirava a Presidência. Mas, de novo, não há nada como o tempo para passar. "No primeiro turno, nós tínhamos nosso candidato, eu defendi o candidato do União Brasil. No segundo turno, eu me coloco claramente contra o Lula e contra o projeto de poder do PT, que querem voltar à cena do crime. Acho isso inaceitável", disse o ex-juiz. Mas há quem veja dente de coelho nesse angu. 
 
De acordo com o portal UOL, Moro negou que esteja buscando um novo cargo numa eventual reeleição de Bolsonaro. O presidente também minimizou a divergência. "Você nunca brigou em casa com marido? Uma briguinha. Acontece, divergências, mas nossas convergências são muito maiores", disse ele quando questionado sobre o assunto.
 
Nas redes sociais, um tuíte em que o ex-juiz critica tanto Lula quanto Bolsonaro voltou a ganhar destaque após o debate do dia 16. Publicada em janeiro, a postagem diz que o presidente "mentiu que era a favor da Lava Jato, mentiu que era contra o Centrão, mentiu sobre vacinas, mentiu sobre a Anvisa e o Barra Torres. Não é digno da Presidência".
 
Sem comentários.

sábado, 15 de janeiro de 2022

ATÉ QUANDO, CATILINA, ABUSARÁS DA NOSSA PACIÊNCIA? (FINAL)

 

Jair Messias Bolsonaro nasceu no município paulista de Campinas, cursou a Academia Militar das Agulhas Negras e se formou em Educação Física e mestre em saltos pela Brigada Paraquedista do Rio de Janeiro. Em 1986, quando servia no 8º Grupo de Artilharia de Campanha, ganhou projeção nacional ao escrever, na seção Ponto de Vista da revista Veja, o artigo intitulado O salário está baixo”. A insubordinação lhe rendeu 15 dias de prisão e 150 telegramas de solidariedade das mais variadas regiões do país, além do apoio de oficiais e de mulheres de oficiais, que realizaram manifestação defronte ao complexo militar da Praia Vermelha, no Rio.

No ano seguinte, Veja noticiou a invasão da prefeitura de Apucarana (PR) pelo capitão Luís Fernando Valter de Almeida — que, à frente de 50 homens, leu manifesto contra os baixos salários das forças armadas — e divulgou um plano em que Bolsonaro e o também capitão Fábio Passos da Silva pretendiam “explodir bombas em várias unidades da Vila Militar, da Academia Militar das Agulhas Negras (...) e em vários quartéis” (a operação só seria executada se o reajuste concedido aos militares ficasse abaixo de 60%, e serviria para “assustar” o ministro do Exército).

Os capitães “negaram peremptoriamente, da maneira mais veemente, por escrito, do próprio punho, qualquer veracidade daquela informação”, mas, após o surgimento de provas documentais (na ocasião da reportagem realizada na Vila Militar, Bolsonaro havia desenhado um croqui, no qual, de forma didática, explicara à repórter o funcionamento de uma carga de dinamite) e depoimentos testemunhais, o ministro do Exército, general Leônidas Pires Gonçalves, deu sinal verde para uma sindicância que concluiu que os insurretos deveriam ser expulsos das forças armadas. Ainda assim, o Superior Tribunal Militar acolheu a tese da defesa, segundo a qual os acusados "foram vítimas de um processo viciado", e a expulsão dos capitães não aconteceu. Mas a carreira militar de ambos terminou ali. 

Bolsonaro passou para a reserva e chegou a cogitar de trabalhar como limpador de casco de navio, aproveitando o curso de mergulho que fizera anos antes, mas sua notória aversão ao batente levou-o a aproveitar a repercussão de sua reforma nos meios militares para se eleger vereador pelo e, na sequência, deputado federal, ambas as vezes pelo PDC. Em 1993, ajudou a fundar o PPR — fruto da fusão do PDC com o PDS — e voltou a provocar polêmica ao defender o retorno do regime de exceção e o fechamento temporário do Congresso.

Observação: A despeito da evidente contradição, o deputado que defendia o fechamento do Congresso — dizendo que preferia “sobreviver no regime militar a morrer nesta democracia” — tornou a se candidatar em 1994 e foi reeleito com 135 mil votos. O TRE-RJ anulou a eleição por suspeita de fraude e realizou um novo pleito, mas Bolsonaro confirmou sua reeleição e foi empossado em fevereiro do ano seguinte.

Em agosto de 1995, com a criação do PPB — resultado da fusão do PPR com o PP —, Bolsonaro migrou para a nova agremiação e foi reeleito, em 1988, com 102.893 votos. Em junho de 1999, a Mesa Diretora da Câmara decidiu propor ao plenário sua suspensão por um mês, por ter defendido o fechamento do Congresso e afirmado que “a situação do país seria melhor se a ditadura tivesse matado mais gente”, incluindo o presidente Fernando Henrique Cardoso. Acabou que a Mesa recebeu uma retratação e decidiu aplicar apenas uma censura, mas voltou atrás quando Bolsonaro alegou que sua assinatura havia sido falsificada. Mesmo assim, a proposta nunca chegou a ser votada pelo plenário da Câmara.

Questionado por empregar em seu gabinete a companheira Ana Cristina Vale, o pai e a irmã dela, Bolsonaro alegou que estava se divorciando e argumentou que, por não ser casado com Ana Cristina, a contratação não caracterizava nepotismo. Em dezembro, durante um almoço de desagravo ao ex-comandante da Aeronáutica, Walter Braüer, o ex-capitão defendeu o fuzilamento do presidente Fernando Henrique Cardoso — chegando mesmo a dizer que o fuzilamento era até “algo honroso para certas pessoas”. O líder do governo na Câmara pediu a cassação de seu mandato, mas, mais uma vez, a proposta nunca chegou ao plenário da casa.

No início de 2000, Bolsonaro defendeu a pena de morte para qualquer crime premeditado e a tortura em casos de tráfico de drogas. Atacou os homossexuais, dizendo não “admitir abrir a porta do meu apartamento e topar com um casal gay se despedindo com beijo na boca, e meu filho assistindo a isso”, e seguiu defendendo os interesses das FFAA. Inconformado com o aumento da ingerência civil sobre os militares a partir da criação do Ministério da Defesa pelo governo FHC, chamou o ministro de “canalha”, “patife” e “imoral”, acusou-o de postergar o reajuste dos militares e de estar “servindo aos interesses dos EUA no país”.

Reeleito em 2002 com 88.945 votos, nosso herói declarou-se contrário à reforma da previdência. Trocou o PPB pelo PTB, que deixou em 2005 para se filiar ao PFL, que deixou meses depois para ingressar no PP (nova denominação do PPB, sua antiga legenda). Quando Roberto Jefferson denunciou o esquema do mensalão, Bolsonaro endureceu seus ataques ao PT e aos políticos do partido envolvidos nos escândalos. Chamou José Dirceu de “terrorista” e José Genoíno de “delator”. Chegou mesmo a levar à CPI do Mensalão o coronel reformado Lício Augusto Ribeiro Maciel, responsável pela prisão e interrogatório do petista em 1972, para desmentir a versão de que ele teria sido torturado para entregar os companheiros.

Em outubro de 2005, por ocasião do referendo sobre a comercialização de armas de fogo, Bolsonaro, crítico contumaz das campanhas de desarmamento anteriores, mandou confeccionar cartazes com frases como “O exército do PT é o MST” e “Entregue suas armas: os vagabundos agradecem”, e posicionou-se entre os defensores e organizadores da campanha do “não”, dizendo ser favorável “ao desarmamento, sim, mas dos bandidos” (ao final, venceram os partidários do “não”, com 63% dos votos).

Reeleito para o quinto mandato consecutivo com 99.700 votos, Bolsonaro se envolveu em mais uma polêmica, dessa vez por conta da situação da reserva indígena Raposa/Serra do Sol, no estado de Roraima. Na ocasião, o representante indígena no debate atirou água no ex-capitão. Em 2009, o PCdoB entrou com representação contra ele, por quebra de decoro.

Reeleito em 2010 com 120.646 votos, Bolsonaro foi candidato à presidência da Câmara e obteve 9 votos — contra 375 do parlamentar eleito, Marco Maia, 106 de Sandro Mabel e 16 de Chico Alencar. Em abril de 2011, criticou o que batizou de “kit gay” e atacou o deputado homossexual Jean Willys (“Eu não teria orgulho de ter um filho como você”). No mês seguinte, meteu-se em nova polêmica envolvendo o projeto de lei que criminalizava a homofobia. 

Em 2014, já de olho no Palácio do Planalto e diante da recusa de Ciro Nogueira, dono PP, em lançar sua candidatura à Presidência, filiou-se ao PSC. Como a sigla também não lhe fez a vontade, reelegeu-se mais uma vez deputado federal (com 464 mil votos). Durante o impeachment de Dilma, dedicou seu voto ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, apontado como torturador durante a ditadura militar, o que lhe rendeu mais uma denúncia ao Conselho de Ética da Câmara (dessa vez por apologia à tortura). 

Em 2017, concorreu novamente à presidência da Câmara, mas obteve míseros quatro votos (o vencedor foi Rodrigo Maia). Ainda em 2017, sem garantias sobre o lançamento de sua candidatura ao Planalto, cogitou de migrar para o PSDC e chegou a assinar um compromisso de filiação ao PEN.

Em 2018, Gustavo Bebianno articulou a filiação de Bolsonaro e filhos e ao PSL de Luciano Bivar. Na condição de pré-candidato à Presidência, o ainda deputado se dedicou a fazer campanha Brasil afora. Sua candidatura foi oficializada em julho de 2018 e recebeu o apoio formal do PRTB, que indicou como postulante a vice o general Hamilton Mourão. À época, Bolsonaro ressaltou que, embora não tivesse amplas estruturas partidárias e dispusesse de pouco tempo de propaganda na televisão, confiava na espontaneidade dos seus apoiadores, que se mobilizariam em plataformas digitais e viabilizariam uma campanha massiva, mas de baixo custo.

No evento de lançamento da candidatura ao Planalto, defendeu a fusão de ministérios, a privatização de braços da Petrobras e o fim da "indústria de multas", fazendo referência às estradas e também a órgãos associados à defesa do meio ambiente e à fiscalização de condições de trabalho. Foram lançadas ainda as candidaturas dos filhos 01 ao Senado e 03 à Câmara Federal (o primeiro pelo Rio de Janeiro e o segundo por São Paulo). 

Nas pesquisas divulgadas ao longo de 2018, o candidato do PSL chegou a ser apontado como o segundo na preferência dos eleitores, atrás apenas do presidiário Lula, que ainda recorria da condição de inelegível, embora já apontasse o duble de poste e bonifrate Fernando Haddad como seu preposto. Iniciada oficialmente a campanha, Bolsonaro seguiu com sua agenda de viagens pelo Brasil até ser esfaqueado, internado e submetido a uma série de intervenções cirúrgicas. O caso teve ampla repercussão e não só colocou o candidato em evidência como lhe serviu de pretexto para escapar dos debates televisivos.

Tendo o antipetismo como principal cabo eleitoral, Bolsonaro confirmou sua liderança no primeiro turno (e ajudou a eleger diversos parlamentares e que o apoiaram em campanha — entre os quais os filhos Flávio Rachadinha, que conquistou uma cadeira no Senado, e Eduardo Bananinha, que passou a integrar a segunda maior bancada na Câmara Federal) e derrotou Haddad no segundo, (com 55% dos votos válidos) eleger. 

Na condição de presidente eleito, iniciou as tratativas para composição de seu quadro ministerial, que prometeu balizar por critérios técnicos (e não ideológicos). Empossado em 1 de Janeiro de 2019, defendeu ampla agenda de reformas, assumiu compromissos com o combate à criminalidade e à ideologia de gênero, alardeou um modelo conservador e tradicional para a "família", implementou um mote com os dizeres "Mais Brasil e menos Brasília" e defendeu o porte de armas, o excludente de ilicitude e o livre mercado como diretriz econômica. E deu no que deu.

Bolsonaro foi casado com Rogéria Nantes Nunes Braga Bolsonaro, vereadora no Rio de Janeiro entre 1993 e 2001 — com quem teve os filhos Flávio, Carlos e Eduardo, que também seguiram pelo política —, contraiu segundas núpcias com Ana Cristina Vale, com quem teve outro filho (Jair Renan), e, em 2007, com Michele Bolsonaro, com quem teve a menina Laura, hoje com 11 anos de idade. 

No âmbito judicial, o "mito" é investigado em seis inquéritos. O assim chamado inquérito das fake news, que tramita no STF, investiga um esquema de disseminação sistemática e organizada de informações falsas com o objetivo de fragilizar as instituições e a democracia. Outro inquérito (esse no TSE) investiga ataques sem provas às urnas eletrônicas e tentativa de deslegitimar o sistema eleitoral brasileiro. Além disso, aliados do presidente foram alvo de operações contra atos ofensivos à democracia e às instituições do Estado. Por último, mas não menos importante: dos cinco filhos que o capitão teve em três casamentos, quatro são investigados pela PF (a exceção fica por conta da caçula).

FONTESPortal da Câmara dos Deputados; Portal do Estado de São Paulo; Portal da Folha de São Paulo; Portal O Globo; Portal Jornal do Brasil; Portal IstoÉ; Portal Veja; Portal do Tribunal Superior Eleitoral; Portal de notícias do Jornal Extra; Portal do El País; Portal do jornal Estado de Minas.

sábado, 6 de novembro de 2021

ERA O QUE FALTAVA!

 

Da equipe de "notáveis" que foram empossados ministros em 1º de janeiro de 2019, contam-se nos dedos de uma só mão os que ainda continuam no cargo — não por competência, mas por rezarem pela cartilha do chefe. O veterinário e político gaúcho Onyx Lorenzoni faz parte dessa tão seleta quão reduzida confraria.

Lorenzoni chefiou inicialmente a Casa Civil da Presidência, de onde saltou para o Ministério da Cidadania, e de lá para a Secretaria-Geral da Presidência da República. Por ocasião da última reforma ministerial, na qual Bolsonaro finalmente entregou o governo ao Centrão, o político gaúcho teve de ceder a poltrona para Ciro Nogueira. Para não deixar seu fiel vassalo ao relento, nosso indômito capitão recriou o Ministério do Trabalho — que ele próprio havia extinguido em 2019.

O Ministério do Trabalho foi criado originalmente em 1930, durante o governo Vargas, e entregue a Lindolfo Leopoldo Boeckel Collor, avô do ex-presidente e ainda senador Fernando Collor de Mello. Durante a nada saudosa gestão do caçador de marajás de araque, a pasta foi chefiada pelo sindicalista Antonio Rogério Magri (para quem o FGTS era "imexível" e sua cadela, Orca, "um ser humano como outro qualquer"). Durante o mandato tampão do vampiro do Jaburu, houve um furdunço envolvendo o notório Roberto Jefferson (que atualmente goza de férias compulsórios no presídio de Benfica) e sua filha Christiane Brasil.

A partir de então, como resultado de uma miserável sucessão de atos de inépcia por parte do gabinete da Presidência da República e de surtos repetidos de demência por parte de integrantes do Poder Judiciário, deu-se uma vacância nesse obelisco da inutilidade — do qual nenhum trabalhador brasileiro honesto sentiu a menor falta durante meses a fio.

Tanto faz que haja um ministro do Trabalho ou que não haja nenhum — não muda nada, e a suspeita, mais do que razoável, é que não mudaria nada jamais, até o fim dos tempos, se o Ministério do Trabalho nunca mais voltasse a ter um ministro. Ou, melhor ainda, que não houvesse mais o próprio ministério em si. Para que mais esse mamute na Esplanada dos Ministérios? Ele, como tantos outros primos, só serve mesmo para seus donos roubarem o Erário público, cevarem manadas inteiras de fiscais que vivem de extorquir empresas e criar novas regras para dificultar cada vez mais a criação e a manutenção de empregos neste país.

A inexistência dessa geringonça que os devotos do “Estado forte” gostam de chamar de “histórica”, porque foi fundada por São Getúlio, pouparia o Brasil das cenas, impróprias para todas as idades. Após ser impedido por um aliado de nomear o ministro que havia escolhido, Michel Temer tentou colocar no cargo uma deputada condenada em duas ações trabalhistas — o que não é pecado para ninguém, salvo para quem fosse assumir, justamente, o raio do Ministério do Trabalho.

Um juiz de Niterói proibiu a posse da filha de Jefferson, e o governo, em pânico, largou as decisões finais para os mais altos tribunais da nação. Para completar, descobriu-se que a ministra nomeada tinha como seu suplente na Câmara dos Deputados um colega que não só foi condenado a 12 anos de prisão por estupro, mas também era irmão do ex-governador Anthony Garotinho, ele próprio um ex-presidiário beneficiado pelo programa “Meu Alvará de Soltura, Minha Vida”, do ministro Gilmar Mendes.

Para que todo esse vexame? Só para ter mais um (ou mais uma) parasita com carro oficial em Brasília, onde sua ausência não é sentida por nenhuma pessoa séria? O único efeito prático de não haver um ministro do Trabalho é que deixam de ser assinadas portarias, e despachos, e ofícios, e o resto de toda essa infame papelada que não serve para coisa nenhuma — ou melhor, serve, e serve muito, mas apenas aos interessados em arrancar do Tesouro Nacional algum proveito para si mesmos.

Mas tudo que foi escrito aqui poderia ter sido escrito em grego, caso alguém imagine que um único político brasileiro possa encontrar alguma coisa de estranho nessa alucinação toda. Para eles, é justamente essa farinata disforme que serve como pão nosso de cada dia. De seu ponto de vista, a única função que o Brasil tem hoje é prover, com o dinheiro dos impostos, sua sobrevivência e prosperidade — sua, das famílias, dos amigos e dos amigos dos amigos.

Com exceção de um ou outro órgão que exerce funções de Estado verdadeiras, o governo brasileiro, como sempre, continua servindo somente para duas coisas: roubar e mentir. Até não muito tempo atrás, a única diferença com o passado recente era que os governos de Lula e de Dilma roubavam e mentiam mais — hoje, já não se sabe. Afora isso, a essência é exatamente a mesma em todos eles, e não apenas na área do Poder Executivo. O Legislativo é um bazar como a Rua 25 de Março em São Paulo ou o Saara no Rio de Janeiro — com a diferença de que nesses dois lugares os padrões de honestidade comercial são incomparavelmente mais elevados. O Judiciário é uma zona de catástrofe da qual qualquer brasileiro decente reza para ficar o mais distante possível.

Voltando aos dias atuais, o multiministro Onyx Lorenzoni, expert em assuntos aleatórios e momentaneamente acomodado na pasta do Trabalho, passa a impressão de estar sempre prestes a decidir de qual borda da terra plana vai pular. Em matéria de vacinas, optou pela borda em que se encontra Bolsonaro. Editou portaria proibindo a demissão de quem não se vacinou e a exigência de atestado de vacinação para a contratação.

Em português claro: Onyx reconheceu por meio de portaria o direito dos sem-vacina de infectar livremente os colegas vacinados no ambiente de trabalho. De uma tacada, afrontou a Constituição, rasgou uma lei sancionada pelo próprio Bolsonaro, atropelou decisão do STF e se colocou na contramão de providências adotadas pelo STJ.

O ministro afrontou a Constituição porque qualquer advogado recém-formado sabe que o direito da sociedade à saúde prevalece sobre o direito individual do cidadão de recusar a vacina. Todos têm o direito de manter suas convicções e idiossincrasias pessoais, desde que não coloquem em risco a vida alheia. Fez picadinho da Lei 13.979/2020, sancionada por Bolsonaro em 6 de fevereiro do ano passado, que prevê no artigo 3º que, para enfrentar emergência internacional de saúde pública, as autoridades podem adotar medidas excepcionais, entre elas a vacinação "compulsória."

Onyx passou por cima do Supremo porque o plenário da Corte já decidiu, ao interpretar a lei retrocitada, à luz da Constituição, em dezembro do ano passado, que a obrigatoriedade da vacina é constitucional. Pela decisão, ninguém será arrastado na marra até a seringa, mas todos os não vacinados estão sujeitos a medidas restritivas — multa e proibição de frequentar determinados lugares, por exemplo.

Como ministro do Trabalho, Onyx não deveria ignorar que o TST, Corte suprema da Justiça trabalhista, começa a exigir na última terça-feira, 3, a exibição de comprovante de vacina para as pessoas que quiserem entrar nas sua sede. Ao noticiar a providência no seu site, a Corte a atribuiu ao "poder-dever da administração pública de proteger a saúde e a integridade física de servidores, colaboradores e usuários de seus serviços". Não é por outra razão que a Justiça do Trabalho vem reconhecendo país afora o direito das empresas de demitir os não vacinados e condicionar as contratações à exibição de atestados de vacina. Tudo ao contrário do que desejam Onyx e, sobretudo, seu amado chefe.

Certos governos só serão perfeitamente compreendidos daqui a um século. Governos incertos como o de Bolsonaro só serão devidamente entendidos no século passado. O presidente e seus áulicos têm o direito de ser ouvidos quando dizem tolices sobre vacinas. Mas isso não inclui automaticamente o direito de serem levados a sério. A portaria de Onyx é uma piada sem graça.

Com J.R. Guzzo e Josias de Souza

domingo, 15 de agosto de 2021

AFRONTA PESSOAL


 

Em mais um capítulo da batalha entre o STF e o Palácio do Planalto e seus apoiadores, o ministro Alexandre de Moraes determinou nesta sexta-feira (13) a prisão preventiva do ex-deputado federal Roberto Jefferson, cuja biografia se confunde com uma folha corrida. 

Bolsonaro não só classificou a decisão do magistrado de "atentado contra a liberdade de expressão" como considerou uma "afronta pessoal", seja porque seus filhos são investigados no âmbito do mesmo inquérito que fisgou o mandarim do PDT, seja porque, na avalição do mandatário, ele próprio é o alvo do ministro.

De ex-presidiário do mensalão, Jefferson se converteu em modelo do bolsonarismo ao percorrer a conjuntura incitando a prática de crimes em entrevistas e nas redes sociais, pregando a intervenção militar sob o comando de Bolsonaro e incitando a invasão do Senado e a destituição dos ministros do Supremo. É graças a esse tipo de pregação que o Brasil se consolida na Era Bolsonaro como o mais antigo país do futuro do mundo.

Jefferson está indo para a cadeia porque tem um entendimento particular da democracia? Porque discorda das decisões de ministros do Supremo? Porque é favorável à reeleição de Bolsonaro? Porque aprova o comportamento do governo federal durante a pandemia? Obviamente não! Isso é parte do proselitismo vagabundo com que os devotos do bolsonarismo tentam imputar ao tribunal — particularmente ao ministro Alexandre de Moraes — uma decisão atrabiliária, autoritária.

Alega essa escumalha que ao determinar a prisão preventiva do ex-parlamentar o ministro ofendeu o direito constitucional à liberdade de expressão — que bolsonaristas e simpatizantes veem como um salvo-conduto para a delinquência e o crime. Tomar crime por liberdade de expressão consiste em instrumentalizar os códigos da democracia para solapá-la; tomar a liberdade de expressão como um crime remete a uma questão quase ancestral, que está em "A República", de Platão, já suficiente e brilhantemente dissecada por Karl Popper em "A Sociedade Aberta e Seus Inimigos", como explanou Reinaldo Azevedo neste artigo.

Não deixa de ser comovente ver defensores de um golpe militar posando de arautos do livre pensar e do livre dizer. A Lei de Segurança Nacional, mesmo com todo o lixão que abrigava, permitia punir os prosélitos do golpismo. E, claro, não por acaso, um bolsonarista como André Mendonça se valeu dessa aberração para punir opiniões desairosas ao presidente da República. Só que não estamos lidando com uma corrente de pensamento política que tenha ao menos coerência interna no seu erro, e sim com oportunistas vulgares, pilantras, aproveitadores, depredadores da ordem democrática, golpistas.

Jefferson é um político flexível. Recompensado, pode ser a favor de tudo ou contra qualquer outra coisa. Integrou a milícia congressual de Collor. Sob Lula, interessou-se pelos negócios dos Correios. Pilhado, virou delator. Ainda não contou como distribuiu o mimo de R$ 4 milhões que recebeu de Delúbio Soares, então gestor das arcas do PT. Sob Dilma, o PTB de Jefferson foi apanhado plantando bananeira na Casa da Moeda. Sob Temer, assumiu o balcão em que se vendiam no Ministério do Trabalho registros de sindicatos por cifras que também roçaram os R$ 4 milhões. Agora, Jefferson retorna à cadeia como herói da resistência do bolsonarismo.

O PTB é um cartório travestido de partido político, que Jefferson preside como dono. O fundo partidário é abastecido com dinheiro público. Os arquivos do TSE informam que o Tesouro pingou R$ 18,8 milhões nas arcas do PTB em 2020. Em 2021, já foram gotejados mais R$ 11,7 milhões.

É o cúmulo da desfaçatez: dinheiro arrancado do bolso do contribuinte e destinado ao financiamento da democracia pode ter sido usado para bancar atividades antidemocráticas.

Com Josias de Souza

quinta-feira, 22 de julho de 2021

PAU QUE NASCE TORTO MORRE TORTO

Após receber alta do hospital Vila Nova Star, no último domingo, Bolsonaro retornou a Brasília "com a corda toda". A princípio, a obstrução intestinal diagnosticada pelos médicos do Hospital das Forças Armadas exigiria uma cirurgia de emergência, daí o esculápio que o acompanha desde o atentado em 2018 recomendou que ele fosse trazido para São Paulo. Acabou que "o paciente respondeu bem ao tratamento convencional" (nada como um bom purgante) e a cirurgia foi descartada. Quando mais não seja, a viagem livrou o capitão da reunião com os presidentes do STF e do Congresso.

Dias antes de ser internado, Bolsonaro levou uma carraspana do ministro Luiz Fux por acusar o TSE de fraude nas eleições. Antes mesmo de receber alta, voltou a atacar o ministro Luís Roberto Barroso, chamando-o de "imbecil" e "idiota". Na semana anterior, depois da conversa com o presidente do Supremo, desagradado com as perguntas de alguns repórteres, disparou: "Eu não vim aqui para brigar com ninguém. Vai acabar a entrevista. Depois diz que eu sou grosso. Vai acabar a entrevista. Vamos rezar o pai nosso aqui, vamos? Vamos rezar? Vamos lá, vamos ajudar, vamos rezar o Pai Nosso".

De volta a Brasília, em conversa com a récua de baba-ovos no chiqueirinho defronte ao Alvorada, Bolsonaro voltou a defender o voto impresso: "Eu entrego a faixa para qualquer um, se eu disputar a eleição, né? Se eu disputar, eu entrego a faixa para qualquer um. Uma eleição limpa. Agora, participar de uma eleição com essa urna eletrônica..."

O ministro Barroso classificou os ataques de "lamentáveis" e "levianos"; Rodrigo Pacheco disse que "quem pretender retrocesso democrático será considerado inimigo da nação". Arthur Lira, que por enquanto continua alinhado com Bolsonaro, afirmou que "não tem compromisso algum com nenhum tipo de ruptura política, institucional democrática". Aliados alertaram o presidente de que sua truculência leva ao delírio seus apoiadores de raiz, mas assusta quem votou nele como alternativa à volta do PT — e a perda desse eleitorado pode ser fatal. Mas Bolsonaro, exemplo do escorpião da fábula, é incapaz de agir contra a própria natureza.

Mudando de um ponto a outro, o presidente que se elegeu com a promessa de acabar com a velha política do "toma-lá-dá-cá" — e que só continua no cargo porque alugou o apoio do Centrão — deve anunciar amanhã a nomeação de Ciro Nogueira para a Casa Civil. O deputado piauiense é considerado a pessoa certa para baixar a fervura no Congresso em tempos de CPI (e outras crises). Com isso, o general Luiz Eduardo Ramos assumirá a Secretaria-Geral e Onyx Lorenzoni comandará o Ministério do Trabalho e Emprego, que será recriado com a divisão do Ministério da Economia.

A troca de cadeiras é uma indicação inequívoca de fragilidade do governo. Antes da posse, o bolsonarismo desdenhava o Centrão; hoje, precisa dele para sobreviver. Cada palavra do célebre "Se gritar pega Centrão, não fica um meu irmão", cantarolado em tom de superioridade pelo general Augusto Heleno na campanha de 2018, teve que ser engolida goela abaixo.

Para os centristas, não existem ideologias, só interesses. Em troca de poder e dinheiro — não necessariamente nesta ordem — eles alugam seu apoio a peso de ouro, seja para dar sustentação ao governo da vez, seja para blindar o governante de turno de um impeachment (por crime de responsabilidade) ou de um processo no STF (por crime comum). Chupam-lhe o sangue a mais não poder e o abandonam à própria sorte ao menor sinal de mudança dos ventos.  

Bolsonaro quer um partido para chamar de seu, mas exige o controle dos fundos partidário e eleitoral. Se estivesse bem na fita, poderia escolher a sigla que mais lhe aprouvesse; com a popularidade em queda livre a CPI nos calcanhares, não está em posição de impor condições. 

Depois que as negociações com o Patriota malograram, restaram-lhe o PTB de Roberto Jefferson — que já foi lulista —, o PMDB (Partido da Mulher Brasileira) e outras siglas nanicas. Se quiser manter o apoio do Centrão, terá de se filiar ao Progressistas de Ciro Nogueira e Arthur Lira, o que significa aliar-se de vez aos verdadeiros profissionais da política tupiniquim. Do contrário, ficará a ver navios pelo binóculo. E sem o papai na Presidência, Zero Um, Zero Dois, Zero Três e Zero Quatro se tornarão Zeros à Esquerda.

A depender dos avanços da CPI, o Centrão abandonará Bolsonaro — atribuindo o desembarque a seu governo errático, caótico. Collor, Lula e Dilma foram páginas viradas pelo Centrão. Mas nada impede que o picareta dos picaretas volte a ser cortejado pelos centristas.

A conferir.

quarta-feira, 30 de outubro de 2019

NÃO HÁ ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS NO BRASIL. O BRASIL É UMA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA



A menos que o imprevisto tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos, encerrar-se-á na próxima semana o julgamento sobre a constitucionalidade (ou não) do cumprimento antecipado da pena após condenação em segunda instância. Quando a sessão foi suspensa, no último dia 24, havia 4 votos a favor da jurisprudência atual e 3 pela mudança, ou seja, pela prisão somente depois do trânsito em julgado — o que nesta banânia equivale a dizer "no dia de São Nunca".

Até agora, somente Rosa Weber e Ricardo Lewandowski seguiram o voto de Marco Aurélio — relator das famigeradas ADCs do PEN, da OAB e do PCdoB, mas tudo indica que Cármen Lúcia deve acompanhar os dissidentes e Gilmar Mendes e Celso de Mello, o relator. Se esse prognóstico se confirmar, caberá a Dias Toffoli proferir o voto de Minerva.

O jurista Modesto Carvalhosa defende a suspensão do julgamento até que o Congresso faça seu papel, e convoca a população a sair as ruas para protestar no próximo dia 9. Independentemente da pressão popular, o mestre de cerimônias do cirquinho supremo já acenou com a possibilidade de mudar seu posicionamento, embora não o tenha dito com todas as letras (detalhes na postagem de anteontem).

Toffoli vinha defendendo uma solução conciliadora — uma "terceira via" nem tanto ao mar, nem tanto à terra, que deságua na prisão após o julgamento dos recursos na terceira instância (STJ). Na última segunda-feira, no entanto, enviou ao Congresso uma proposta para alterar o Código Penal e impedir a prescrição dos processos que chegam ao STJ/STF. Assim, o prazo prescricional seria suspenso (ou seja, pararia de contar) na segunda instância, mesmo que réus investigados, que já foram condenados, entrassem com recursos em instâncias superiores. Já há precedentes na 1ª Turma no sentido de que a decisão na segunda instância interrompe a contagem da prescrição, mas a 2ª Turma, que conta com Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello, costuma se posicionar no sentido contrário.

A corrupção sempre campeou solta sob as barbas do Gigante Adormecido, mas só foi institucionalizada no governo Lula, a partir de quando os bandidos de gravata, estimulados pela sensação de impunidade, passaram a roubar com uma voracidade nunca vista na história deste país. O cenário começou a mudar em 2012 com o julgamento da Ação Penal 470 — mais conhecida como processo do Mensalão —, da qual Lula, inacreditavelmente, escapou incólume.

Para se ter uma ideia de como a Justiça é "célere" no país da impunidade (entre aspas para ressaltar a ironia), basta lembrar que o Mensalão foi delatado em 2005 pelo ex-deputado Roberto Jefferson, um dos condenados. O Supremo só começou a julgar o caso em agosto de 2012 e terminou, após um ano e meio e 69 sessões, com a apreciação dos embargos infringentes. Dos 38 réus no processo, 24 restaram condenados.

A Lava-Jato teve início em 2009 — com a investigação de crimes de lavagem de recursos relacionados ao ex-deputado federal José Janene e aos doleiros Alberto Youssef e Carlos Habib Chater —, mas sua primeira fase ostensiva foi deflagrada somente em março de 2014. Cumpriram-se então 81 mandados de busca e apreensão, 18 de prisão preventiva, 10 de prisão temporária e 19 de condução coercitiva, em 17 cidades de 6 estados e no DF. Como mais de 80 mil documentos foram apreendidos pela PF — além de diversos equipamentos de informática e celulares — Rodrigo Janot, então no comando da PGR, designou um grupo de procuradores para analisar todo esse material e propor as acusações, e do trabalho dessa equipe resultaram as primeiras denúncias.

As apurações indicavam a existência de um grande esquema de corrupção e lavagem de dinheiro na Petrobras, o que levou à segunda fase do caso. Atendendo a um pedido da defesa dos envolvidos, o STF suspendeu as investigações, e o ministro Teori Zavascki determinou que somente a parte que tocava aos investigados com direito a foro privilegiado permanecesse no STF. Meses mais tarde, Paulo Roberto Costa assinou um acordo de colaboração com o MPF, comprometendo-se a devolver a propina recebida (incluindo os milhões bloqueados no exterior), detalhar todos os crimes cometidos e a apontar os demais participantes. Depois dele foi a vez de Alberto Youssef, e vários acordos de colaboração importantes foram negociados pela força-tarefa — os que não envolviam políticos com prerrogativa de foro foram enviados para a 13ª Vara Federal do Paraná, comandada pelo então juiz Sérgio Moro.

Ao completar 5 anos, a maior operação contra a corrupção da história deste país contabilizou 242 condenações contra 155 pessoas em 50 processos por lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, fraude à licitação, organização criminosa, evasão de divisas, lavagem de dinheiro, tráfico internacional de drogas, crime contra a ordem econômica, embaraço à investigação de organização criminosa e falsidade ideológica. Nesse período, R$ 2,5 bilhões retornaram à Petrobras, a principal estatal lesada pelo esquema — uma média de R$ 1,37 milhão por dia devolvido aos cofres públicos desde 2014. No total de 13 acordos de leniência com empresas envolvidas, está previsto o ressarcimento de R$ 13 bilhões, valor superior à previsão de gastos da Justiça Federal (R$ 12,8 bi) ou do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (R$ 11,9 bi) descritos no Orçamento Anual de 2019. Segundo o MPF, o valor apurado pode chegar a R$ 40 bilhões.

Como toda ação implica uma reação, as articulações capitaneadas por caciques políticos, líderes partidários, congressistas e até membros do alto escalão do poder Judiciário cresceram em progressão geométrica. Fossemos relembrar aqui principais ataques sofridos pela Lava-Jato, esta matéria se desdobraria em pelo menos uma dúzia de capítulos, mas pode-se resumir a ópera dizendo simplesmente que, a despeito do que alardearam os alarmista de plantão, a força-tarefa, qual Fênix mitológica, renasceu das cinzas uma vez depois da outra. Pelo menos até agora.

A ação do espúrio site The Intercept foi fundamental para a formação da tempestade perfeita, sobretudo quando Moro, Dallagnol e companhia se tornaram alvo dos vazamentos verdevaldianos, que tanta alegria proporcionaram aos políticos corruptos e os criminalistas estrelados que cobram honorários milionários para postergar sua prisão.

Num país minimamente sério, diálogos não periciados e obtidos criminosamente pelo hackeamento de 1000 celulares de autoridades governamentais, membros do judiciário, procuradores e políticos iriam para a lata do lixo juntamente com Verdevaldo das Couves, o coveiro de reputações. Mas não numa republiqueta de bananas, onde Verdevaldo é tratado pela mídia "cumpanhêra" como herói nacional. Acho até que ele só não foi sondado por algum partido para disputar as próximas eleições presidenciais porque nossa Constituição (que não é lá grande coisa) determina que somente brasileiros natos podem concorrer ao cargo de presidente desta banânia.

Ainda que os diálogos atribuídos a Moro, Dallagnol e companhia fossem periciados e tidos como verdadeiros, sua origem continuaria sendo criminosa, torando-os imprestáveis como prova em juízo. E mesmo que as transcrições não tivessem sido editadas ou manipuladas de alguma maneira — o que se admite apenas para efeitos de argumentação — elas nada comprovam senão o empenho do ex-juiz da Lava-Jato e dos procuradores da força-tarefa na defesa dos interesses da sociedade e sua determinação na luta contra a grande corrupção, mesmo tendo de enfrentar os mais poderosos corruptos da República.

Curiosamente, baixada a poeira que se levantou com a prisão do bando responsável pelo hackeamento, a imprensa quase nada mais publicou de relevante sobre o assunto, sobretudo depois que as investigações apontaram o possível envolvimento da pecedebista Manuela D'Ávila, que compôs com o bonifrate de Lula a chapa derrotada pelo capitão caverna nas eleições presidenciais de 2018. Poder-se-ia atribuir essa "perda de interesse" às estultices de Bolsonaro, à tramitação conturbada da PEC Previdenciária e, mais recentemente, à disputa por poder e dinheiro entre o capitão caverna e integrantes da alta cúpula do PSL. Mas não se pode perder de vista o fato de que veículos supostamente isentos e respeitáveis — como Folha, UOL, BandNews e Veja, entre outros — seguiram Verdevaldo como os ratos na fábula do Flautista de Hamelin. 

E incontestável que a opinião pública, como que tomada de uma “cólera santa” contra a podridão que a Lava-Jato trouxe a lume, contribuiu em grande medida para o impeachment da gerentona de araque e, mais adiante, para o encarceramento de seu criador e mentor — a autodeclarada "alma viva mais honesta do Brasil", em cuja alegada lisura no trato com a coisa pública muita gente ainda acredita —, mas não é esse o ponto, e sim o fato de termos subestimado a resiliência do crime organizado. Mas é igualmente incontestável que políticos corruptos, como as baratas, são capazes de sobreviver aos piores cataclismos, até mesmo nucleares.

Mesmo com vários chefes da corrupção presos (inclusive o capo di tutti i capi), os interesses dos corruptos vem sendo garantido por uma engenhosa articulação suprapartidária, cujas ramificações vão de dentro de uma cadeia no Brasil até o exterior e que se alimenta da vaza-jato do Intercept et caterva, cujo primeiro alvo, como dito linhas atrás, foi o ex-juiz federal e atual ministro da Justiça, tido e havido como algoz dos corruptos devido a sua seriedade, coragem, tenacidade e eficiência no combate à corrupção e a impunidade no Brasil.

É nesse pé que a coisa está. Resta saber como ficará, pois a política é como as nuvens no céu: a gente olha, elas estão de um jeito; olha de novo, e tudo mudou. Tomara que mude para melhor.

domingo, 18 de março de 2018

TEMER E SUA EQUIPE DE NOTÁVEIS (CONTINUAÇÃO)



Desde maio de 2016, quando assumiu interinamente a presidência, poucos foram os momentos em que Michel Temer se viu distante de desgastes políticos envolvendo a Esplanada dos Ministérios. A partir dos primeiros anúncios sobre seu alto escalão ― uma equipe de notáveis, segundo o presidente ―, uma relação de controvérsias marcou sua gestão no campo ministerial. Aliás, logo de início ele anunciou que reduziria de 32 para 23 no número de pastas, mas voltou atrás diversas vezes, e hoje temos 29 ministérios, três a menos do que quando Dilma foi afastada.

Da tal equipe de notáveis ― que na verdade era uma notável agremiação de investigados, denunciados e réus na Lava-Jato ― o senador Romero Jucá foi o primeiro a cair, depois de comandar por apenas 11 dias o ministério do Planejamento. Jucá é também o primeiro político com foro privilegiado a se tornar réu no STF a partir das delações da Odebrecht, conforme eu comentei na postagem anterior e voltarei a comentar numa próxima publicação).

Criticado por ter montado um staff sem diversidade racial e de gênero, Temer ― que dizia não se preocupar em ser popular, mas sim em recolocar o país nos trilhos ― indicou mulheres para postos importantes, como Maria Silvia Bastos para chefiar o BNDES (ela se demitiu em maio de 2017) e Flávia Piovesan para a secretaria de Direitos Humanos (ela foi exonerada no fim de 2017). Aliás, a secretaria de Direitos Humanos (para que diabos precisamos disso?), depois de ganhar status de ministério, tornou-se palco da tragicomédia protagonizada pela desembargadora aposentada Luislinda Valois (que se demitiu no mês passado ― e não deixou saudades).

Quando Temer assumiu a presidência, a Lava-Jato (que completou 4 anos na última sexta-feira) soprava sua segunda velinha, e já havia inquéritos envolvendo “notáveis” como Romero Jucá, Henrique Eduardo Alves e Fábio Medina Osório. Em janeiro do ano seguinte, a homologação das delações da Odebrecht deu origem a mais uma centena de inquéritos e envolveu pelo menos 8 ministros, aí incluídos amigos próximos do presidente, como Eliseu Padilha e Moreira Franco. Mas a promessa de demitir ministros que fossem denunciados formalmente (detalhes no post anterior) foi solenemente ignorada depois que sua conversa de alcova com o açougueiro bilionário Joesley Batista veio a público. A partir de então, Temer mandou às favas os escrúpulos e acionou sua tropa de choque para comprar os votos necessários ao sepultamento das denúncias Janot. Conseguiu, mas a um preço absurdo, além de queimar seu capital político e se tornar um pato-manco, refém das marafonas do Congresso.

Entre este mês e o próximo, o presidente terá de substituir ao menos 10 ministros, para que eles possam disputar as próximas eleições. A julgar pelo imbróglio que se seguiu à nomeação da filha de Roberto Jefferson para a pasta do Trabalho, será um caminho espinhoso a trilhar.

Um levantamento feito pelo G1 revela que quase metade dos 54 senadores cujos mandatos terminam neste ano perderão o foro privilegiado se não se reelegerem. Dentre os emedebistas, cito o onipresente Romero Jucá ― ora réu no STF e alvo de pelo menos mais uma dúzia de inquéritos na Justiça ―, o atual presidente do Senado, Eunício Oliveira, seu antecessor, Renan Calheiros (que também é réu no STF), os ex-presidentes da Casa Garibaldi Alves Filho, Jader Barbalho e Edison Lobão (todos investigados na Lava-Jato), além de Valdir Raupp, que já é réu no Supremo, e Eduardo Braga.

Nas fileiras do PT, destaco Gleisi Hoffmann (presidente do partido e ré no STF) e seus esbirros Lindbergh Farias, Humberto Costa e Jorge Viana. No mesmo barco estão os presidentes do DEM, Agripino Maia, e do PP, Ciro Nogueira (além do líder do PP no Senado, Benedito de Lira, e do senador Ivo Cassol, já condenado pelo Supremo numa ação sem ligação com a Lava-Jato). Lídice da Mata e Vanessa Grazziotin, líderes do PSB e do PC do B, respectivamente, também estão no último ano do mandato e são alvo da Lava-Jato. 

Entre os tucanos, são investigados na Lava-Jato e correm o risco de perder o foro privilegiado o vice-presidente do Senado, Cássio Cunha Lima, o ex-presidente do partido, Aécio Neves, o atual ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes (que foi candidato a vice-presidente da República em 2014, na chapa encabeçada por Aécio) e os senadores Ricardo Ferraço e Dalirio BeberTutti buona gente. Cabe a nós, eleitores, botar um ponto final nessa putaria franciscana.

E falando em "buona gente" e em suruba, volto a Romero Jucá na próxima postagem. Até lá.

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domingo, 11 de março de 2018

SOBRE O PTB, CRISTIANE BRASIL ― AQUELA FOI SEM NUNCA TER SIDO ― E OUTRAS CONSIDERAÇÕES


O começo deste ano foi marcado por mais um embate entre o Executivo e o Judiciário, desta vez envolvendo a nomeação da filha de Roberto Jefferson ― aquele do Mensalão ― para o ministério do Trabalho. No entanto, ao decretar a intervenção federal no RJ, o presidente Temer mandou para as calendas a reforma previdenciária, e a pendenga da nomeação perdeu o objeto, já que os votos da bancada petebista (vinculados à nomeação da moçoila por exigência de seu papai) deixaram de ser prioridade para o governo. 

Numa das minhas postagens sobre esse tema, ponderei que “As sucessivas derrotas na Justiça desgastam a imagem do presidente, mas ele não quer desagradar o PTB de Roberto Jefferson por razões fáceis de entender. Difícil é compreender por que Cristiane não abre mão do cargo de ministra, a despeito de toda essa celeuma. O que move a moçoila não é o foro privilegiado, que, como deputada, ela já tem. Tampouco me parece ser o salário, visto que um deputado federal ganha R$ 33.763,00 por mês”. E concluí com a seguinte pergunta:Será apenas uma questão de ego, ou será que tem dente de coelho nesse angu? Responda quem souber

A resposta veio na edição de Veja da semana passada, sob o título “O NOVO ESQUEMA DO PTB”. Assinada por Thiago Bronzatto, a matéria detalha a corrupção no ministério do Trabalho e associa ao fato a insistência de Roberto Jefferson em manter a pasta sob o comando de um petebista de sua confiança ― aliás, como eu disse mais de uma vez, se a nomeação da filhota prosperasse, seria o papai quem puxaria os cordéis.

Segundo a reportagem, uma conversa mantida no ano passado e gravada por um dos interlocutores revela dois lobistas pedindo R$ 4 milhões a um empresário em troca de um serviço junto ao ministério do Trabalho.

Observação: É nítida a semelhança entre esse episódio e o ocorrido em 2005, quando Maurício Marinho ― então funcionário do alto escalão dos Correios ― foi filmado confidenciando a um interlocutor que havia chegado ao posto por indicação do PTB e que sua missão era arrecadar propinas para o partido. O esquema, como se descobriu mais adiante, era replicado em dezenas de repartições e gabinetes, e acabou conhecido como “Mensalão” ― depois que o mesmo Roberto Jefferson trouxe à público seus detalhes sórdidos. Curiosamente, o maior beneficiário da maracutaia disse que nada viu, nada ouviu e de nada sabia, e escapou incólume da ação penal 470, na qual 37 réus foram julgados e 24, condenados (dentre os quais Dirceu, Genoino, Delúbio, Vaccari e outros petralhas notórios).

Agora, o mesmo PTB do mesmo Roberto Jefferson aparece operando o mesmo esquema. A diferença é que a base das operações ilegais se transferiu para o ministério do Trabalho ― o mesmo ministério que sua filha ficou 47 dias lutando para ocupar. Isso nos leva de volta à pergunta: Por que Cristiane Brasil insistiu tanto em ser ministra do Trabalho? A resposta está no diálogo a que eu me referi parágrafos atrás, mantido entre os lobistas e o empresário gaúcho Afonso Rodrigues de Carvalho.

Dono de uma pequena transportadora e presidente do Sintrave ― um sindicato de microempresas do Estado de Goiás ― o gaúcho Afonso Rodrigues de Carvalho pelejava para obter um registro sindical para oficializar sua atividade. Vendo que o processo não avançava, o empresário recorreu à lobista Verusca Peixoto da Silva, que dizia ter “boas conexões políticas”, e foi apresentado a seu parceiro de negócios, Silvio Assis, dono de uma consultoria financeira e que tem livre trânsito em diversos ministérios e órgãos públicos.

Para resumir a história, Rodrigues gravou a conversa em que Assis revelou a existência de um conluio entre o PTB e o Solidariedade para achacar o setor de registro de sindicatos. Para destravar o processo, o lobista pediu R$ 1 milhão no ato e R$ 3 milhões quando o registro fosse concedido, explicando que parte do dinheiro seria usada para subornar o pessoal técnico do ministério, e a outra parte, para o pessoal político ― entre eles o deputado Jovair Arantes, do PTB. O empresário procurou a PF, que o orientou a manter os contatos enquanto os agentes monitoravam tudo. E assim foi feito.

Rodrigues negociou com Verusca um abatimento, e conseguiu baixar o preço para R$ 3,2 milhões. Para fechar o negócio, um “contrato de consultoria” foi assinado e entregue ao empresário num posto de gasolina no interior de Goiás (o encontro foi filmado; para assistir ao vídeo, clique aqui). Orientado pela PF, Rodrigues pediu uma nova reunião, que foi realizada num hotel em Brasília e contou com a presença de Rogério Arantes, sobrinho do deputado Jovair Arantes e diretor do INCRA indicado pelo PTB. Rogério prometeu interceder junto a Leonardo Arantes ― outro sobrinho do deputado Jovair, indicado pelo tio para o ministério do Trabalho em maio de 2016, quando Dilma foi afastada e Temer assumiu interinamente a presidência.

Para resumir a novela, as investigações da PF apontam que quem dá as cartas no ministério do Trabalho é o PTB e o Solidariedade (ambos fazem parte da base aliada do governo Temer). Os agentes continuam realizando operações monitoradas, e um pedido para investigar elementos do esquema que contam com prerrogativa de foro já foi apresentado ao supremo. O segredo de Justiça não permite saber que são esses indivíduos, mas os únicos políticos com foro privilegiado no caso são Jovair Arantes e Paulinho da Força.

Com exceção da lobista Verusca, que entregou candidamente a rapadura ― “se você não paga, não sai”, disse ela à reportagem de Veja ― todos os envolvidos negam qualquer irregularidade. Mas até aí morreu o Neves. Lula também protesta inocência, foi condenado a 9 anos e meio e teve a pena aumentada para 12 anos 1 mês de prisão pelo TRF-4.

Como dizia José Saramago, prêmio Nobel de literatura em 1998, “a cegueira é um assunto particular entre as pessoas e os olhos com que nasceram; não há nada que se possa fazer a respeito”.  

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sábado, 24 de fevereiro de 2018

CRISTIANE BRASIL NO MINISTÉRIO DO TRABALHO ― FIM DA NOVELA?



O fato de não simpatizar com Lula e o PT não faz de mim um admirador incondicional de Michel Temer ― que, a meu ver, é um rebento gerado e parido por Lula e o PT.  Mas isso não torna o impeachment da anta menos oportuno nem muda o fato de que o vampiro do Jaburu reconstruiu, em um ano e meio, boa parte do que o tsunami dilmista arrasou em um mandato e meio. Basta comparar os indicadores financeiros atuais com os de 2014, 2015 e 2016 para ver que, se o país não voltou a crescer como gostaríamos, ao menos a economia está no rumo certo.

Mas não há como admirar alguém que, pego com as calças na mão e a cueca machada pelo batom da JBS, proteste inocência, diga que a investigação pedida pelo Supremo será o território onde surgirão todas as explicações e então faça “o diabo” para impedir o andamento da investigação que ele próprio afirmou defender. E isso é apenas um exemplo de sua conversa de camelô paraguaio

Para encurtar o que poderia ser uma longa (e repetitiva) história: Temer teve mais sorte (ou mais traquejo) que Dilma para escapar da deposição ― pelo menos até agora, já que o caso Rodrimar é uma ameaça real, embora as investigações dificilmente serão concluídas durante os 10 meses que faltam para ele deixar a presidência. Mas o fato é que o presidente se tornou refém do Congresso ― um chefe de governo sem voz ativa, uma marionete manipulada por parlamentares ávidos por cargos, verbas, emendas e outras benesses, pelos quais é chantageado dia sim, outro também e, pior, que cede sistematicamente às intimidações.

Observação: Temer sempre aspirou à reeleição, embora dissesse se contentar em entrar para a história como “o cara que recolocou o Brasil nos trilhos do crescimento”. Em vez disso, ele será lembrado como o primeiro presidente denunciado, no exercício do cargo, por crimes de corrupção, obstrução da Justiça e associação criminosa, mas essa já é outra conversa.

De olho nos votos do PTB para aprovar a PEC da Previdência, o presidente aceitou a indicação de Roberto Jefferson ― aquele que foi condenado a sete anos e 14 dias de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, mas teve a pena reduzida por delatar o esquema do “mensalão” ― para substituir o petebista Antonio Nogueira no comando do Ministério do Trabalho. Ocorre que a indicada ― Cristiane Brasil, filha de Jefferson ― foi processa na Justiça trabalhista por dois ex-motoristas que trabalharam para ela sem registro em carteira. Isso levou o juiz da 4.ª Vara Federal de Niterói a suspender a nomeação e a cerimônia de posse, que classificou como “um desrespeito à moralidade administrativa. Houve apelações, tanto por parte do governo quanto de Cristiane, mas as instâncias superiores rejeitaram os pedidos, e hoje, dois meses depois da demissão de Nogueira, o Ministério do Trabalho continua acéfalo e a filhota de Jefferson, que havia se licenciado do mandato de deputada para assumir a pasta, segue desempregada.

Foi um erro nomear Cristiane e uma burrice levar adiante a queda de braço, já que as sucessivas derrotas na Justiça desgastaram ainda mais a imagem do governo. Mas a causa perdeu o objeto com a intervenção federal no Rio de Janeiro, já que nenhuma proposta de emenda constitucional poderá ser votada durante a vigência do decreto (que já foi avalizado na Câmara e no Senado e deve viger até 31 de dezembro próximo). Portanto, já não há motivo para esticar a corda em troca do apoio dos petebistas numa votação que não vai mais ocorrer (pelo menos sob a batuta do atual governo). Mas tudo isso nos leva às seguintes perguntas: 1) O que dizer de alguém que erra e, mesmo consciente do erro, insiste em mantê-lo até as últimas consequências? 2) O que dizer de um ministério que está acéfalo há dois meses e ninguém sente a menor falta do ministro?

A moral da história é que provavelmente nada mudaria se o Ministério do Trabalho nunca mais voltasse a ter um ministro ― ou se o próprio ministério deixasse de existir. Esse mamute, como muitos de seus irmãos e primos na Esplanada dos Ministérios, serve apenas para roubar dinheiro público e encher as burras de fiscais que vivem de extorquir empresas e criar dificuldades para vender facilidades.

Observação: Elon Musk mandou um Tesla Roadster para a órbita de Marte, para que algum dia seja encontrado por alienígenas. Bem que poderia ter aproveitado para colocar no foguete outras coisas que parecem não ter finalidade óbvia, como o Ministério do Trabalho, boa parte do Congresso Nacional, e por aí vai...

A Justiça do Trabalho ― criada há 88 anos por Getúlio Vargas ― custa em um ano, entre salários, custeio e outros gastos, o dobro do que concede em ganhos de causa à classe trabalhadora deste país. Como seria possível, numa sociedade racional, consumir duas unidades para produzir uma — e achar que está tudo bem? Que justiça existe em gastar 17 bilhões de reais de dinheiro público ― que não é “do governo”, mas de todos os brasileiros que pagam imposto — para gerar 8 bilhões? É obvio que alguma coisa deu monstruosamente errado aí.

Por essas e outras, fechar esse ralo pouparia o país de despesas e evitaria cenas burlescas, como as exibidas no caso de Cristiane, que começou quando Temer foi impedido por um aliado de nomear o ministro que havia escolhido e forçado a dar o cargo à cria de Jefferson. Claro que o fato de ela ter sido condenada nas ações trabalhistas não é, por si só, demérito nenhum, mas é evidente que isso “não pega bem” para quem vai comandar justamente o Ministério do Trabalho (como não pega bem juiz que tem domicílio próprio na comarca onde atua receber auxílio-moradia, embora o benefício seja "legal").

Mas não é só. Esse imbróglio monumental revelou também que o suplente de Cristiane Brasil na Câmara é Nelson Nahin, irmão do ex-governador Anthony Garotinho, mas mais conhecido por ter sido condenado a 12 anos por estupro de vulnerável ― ele passou quatro meses na cadeia, mas foi solto mercê um habeas corpus do ministro Ricardo Lewandowski.

Vale lembrar que Garotinho também já foi condenado ― a 9 anos, 11 meses e 10 dias de prisão por corrupção eleitoral, associação criminosa, supressão de documento público e coação durante o processo ― e foi igualmente beneficiado pelo programa “Meu Alvará de Soltura, Minha Vida”, só que pelo ministro Gilmar Mendes.

Pausa para aplaudir o STF.

Na visão obtusa de nossos governantes e representantes públicos, o dinheiro dos impostos serve exclusivamente para prover a sobrevivência e a prosperidade dos políticos, suas famílias, amigos e amigos dos amigos. E mais: com a possível exceção da equipe econômica, das Forças Armadas, do Itamaraty e de um ou outro órgão que exerce funções de Estado verdadeiras, o atual governo serve apenas para roubar e mentir. A diferença em relação aos governos de Lula e Dilma é que, naqueles, roubava-se e mentia-se mais.

Mudam as moscas, mas a merda continua a mesma, e não apenas no Executivo: o Legislativo é um mercado persa, só que com padrões de honestidade comercial ainda mais rasteiros, ao passo que o Judiciário é uma zona de catástrofe da qual qualquer cidadão decente reza para ficar o mais distante possível.

Enfim, no último dia 20, Roberto Jefferson comunicou que o PTB desistiu de indicar Cristiane Brasil para o ministério do Trabalho. Vale lembrar que, da esquadra de 28 ministérios, 13 terão novos comandantes em breve, já que os atuais devem se desincompatibilizar para disputar as eleições de outubro. É recomendável, portanto, que o presidente analise com cuidado as indicações, ou acabará tentando emplacar Fernandinho Beira-Mar no recém-criado Ministério da Segurança, por exemplo. A julgar pelos congressistas que temos...

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