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sábado, 31 de março de 2018

TOFFOLI DISPUTA COM GILMAR MENDES O TITULO DE LAXANTE TOGADO



Logo depois que o STF adiou o julgamento do habeas corpus de Lula e lhe garantiu o estapafúrdio salvo-conduto, Dias Toffoli decidiu (monocrática e liminarmente) aceitar os argumentos da defesa de Paulo Maluf e conceder-lhe o benefício da prisão domiciliar por “motivos humanitários”.  

Até dezembro do ano passado, quando finalmente foi preso, o turco lalau, que tem 86 anos e “graves problemas de saúde”, saltitava alegremente pelos corredores do Congresso. Quanto deu entrada na Papuda, foi de cadeira de rodas, muleta, bengala e o escambau. Na noite da última quarta-feira, depois de passar mal na cela, ele foi transferido para um hospital particular de Brasília. De lá para o aeroporto foi um pulo: de acordo com à decisão “humanitária” do ilustre ministro Dias Toffoli, o eterno deputado poderá cumprir prisão domiciliar.

Observação: A vida real é prenhe de fatos estranhos. Haja vista o suspeitíssimo atentado à bala contra a caravana de Lula. Mas isso já é outra conversa.

Toffoli anulou decisão de seu colega de corte e de turma, ministro Edson Fachin, segundo a qual Maluf deveria cumprir em regime fechado a pena de 7 anos, 9 meses e 10 dias a que restou condenado em última instância. Para o luminar do saber jurídico petista, a decisão de Fachin "inadmitiu monocraticamente os embargos infringentes e determinou o imediato início da execução do acórdão condenatório, sem nem mesmo a devida abertura de vista prévia ao recorrido [Ministério Público] para contrarrazões, no prazo de quinze dias, violando o procedimento legal previsto no artigo 335 do Regimento Interno do STF”.

Toffoli assinalou ainda que “o Tribunal Pleno já deferiu habeas corpus contra ato praticado por próprio colega, no caso o então ministro Cezar Peluso”, de modo que não é inédita tal atuação. Mas o que o ministro quis ― ou quer, ou parece querer ― é oficializar a baderna na Corte. E quando se deseja bagunçar um tribunal, basta um membro começar a dar liminares contra decisões de colegas, em habeas corpus e mandados de segurança.

José Antonio Dias Toffoli prestou concurso para juiz de Direito por duas vezes, e foi reprovado em ambas. Mas quem tem padrinho não morre pagão, e mesmo sendo considerado incapaz de assinar uma simples sentença de despejo, ele acabou sendo indicado por Lula ao STF em 2009 (volto a esse assunto mais adiante). Por mal dos nossos pecados, a menos que o imprevisto tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos até 12 de setembro, Toffoli sucederá à ministra Cármen Lúcia na presidência da Corte, e ainda poderá nos agraciar com suas sapientíssimas decisões por mais 20 anos, uma vez que nasceu em 1967, e a aposentadoria dos membros do Supremo só é compulsória a partir dos 75 anos (a idade limite era de 70 anos, mas foi alterada em 2015).

Quando o Mensalão estourou, em 2005, Toffoli trabalhava na Casa Civil e respondia diretamente ao então ministro José Dirceu, apontado como chefe do esquema ― o que inacreditavelmente não o impediu de participar do julgamento da ação penal 470, anos depois, nem de votar pela absolvição de Dirceu, alegando que não havia provas suficientes contra o petista (embora tenha votado pela condenação de José Genoino, ex-presidente do PT, e de Delúbio Soares, ex-tesoureiro da facção criminosa. 

Em 2015, pouco depois da divulgação da primeira “lista de Janot”, Toffoli pediu transferência da primeira para a segunda turma, que ficaria responsável pelos processos da Lava-Jato. Foi ele quem sugeriu que casos que não tivessem conexão com a Petrobras não deveriam ficar nas mãos do juiz federal Sergio Moro, livrando por tabela o rabo da senadora Gleisi Hoffmann. Também foi ele o autor do peido de vista que interrompeu a votação da limitação do foro privilegiado de políticos quando já se havia formado maioria de ministros a favor (ele liberou o processo dias atrás, mas a presidente ainda não pautou a continuação do julgamento).

As investigações da força-tarefa chegaram a bafejar no cangote de Toffoli quando Léo Pinheiro mencionou em sua proposta de delação que a OAS havia executado reformas na casa do ministro. Mas a informação vazou, Veja publicou, Janot (outro notório admirador do lulopetismo) rodou a baiana e o acordo de colaboração nunca chegou a ser firmado. Aliás, a Lava-Jato também descobriu que um consórcio suspeito de firmar contratos viciados com a Petrobras chegou a repassar R$ 300 mil em três anos ao escritório de advocacia de Roberta Gurgel, esposa de Toffoli. O próprio ministro foi sócio do escritório até 2007, mas deixou a sociedade antes dos pagamentos começarem.

Enfim, Gilmar Mendes que se cuide, ou perderá para Dias Toffoli o título de laxante togado ― do qual o ministro-deus parece se orgulhar, em vista de como ele vem julgando os pedidos de habeas corpus que caem na sua bancada.

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quarta-feira, 25 de julho de 2018

NO BRASIL EXISTEM RÉUS E RÉUS




Ainda sobre o Judiciário e o STF, a revista digital CRUSOÉ publicou dias atrás um artigo cuja leitura eu recomendo, mas que também transcrevo em versão editada, pois o acesso é restrito aos assinantes da revista. 

O texto começa falando de uma carta enviada ao STF por Arthur Rocha, que está preso há 5 anos em Presidente Venceslau, no interior de São Paulo. Ele é cego e foi condenado por homicídio, embora alegue legítima defesa — aliás, em termos de concentração de inocentes, os presídios de segurança máxima tupiniquins só perdem mesmo para o Congresso Nacional.

Na missiva (manuscrita) encaminhada a nossa mais alta Corte, Rocha diz que “não é possível que a justiça do Brasil conceda este tipo de cumprimento de pena somente a pessoas como Abidel Massi (sic) e Paulo Maluf.” À luz das sucessivas notícias de habeas corpus concedidos a presos estrelados, ele pediu aos ministros que analisassem a possibilidade de libertá-lo por razões humanitárias, mas o pedido foi em vão.

Arthur Rocha integra um grupo de réus e condenados que, diferentemente da seleta confraria dos famosos, não teve a sorte de conseguir uma vitória no Supremo. Seu processo nem sequer avançou, ainda que maio e junho tenham sido meses profícuos para investigados da Lava-Jato do Rio e de Curitiba: Gilmar Mendes libertou mais de 20 presos do braço fluminense da Lava-JatoDias Toffoli foi o relator da da reclamação que resultou na soltura seu ex-chefe, José Dirceu, condenado a 30 anos, mas libertado a partir de uma decisão “de ofício” — concedido pelo juiz a despeito de a defesa do paciente não ter pedido expressamente o benefício.

Observação: Meses atrás, Toffoli concedeu habeas corpus ex officio a Paulo Maluf, o ex-deputado e ex-prefeito de São Paulo condenado a 7 anos e 9 meses por lavagem de dinheiro (decisão já transitada em julgado, ou seja, contra a qual não cabe mais nenhum recurso). Segundo o ministro, o turco ladrão estava à beira do desencarne e precisava de atendimento médico especializado. Foi internado no renomado Hospital Sírio Libanês, de onde teve alta e foi despachado para sua mansão nos Jardins. Ao que tudo indica, sua saúde vai muito bem, obrigado.  

De maio para cá, cerca de 230 habeas corpus chegaram ao gabinete do todo-poderoso Gilmar, mas pelo menos 40 estão parados desde então. Não houve sequer citação do Ministério Público para manifestação a favor ou contra os pedidos, nem qualquer despacho requisitando informações às partes envolvidas.

Sob a pena de Toffoli, seis reclamações envolvendo processos criminais semelhantes àquela que resultou na soltura de José Dirceu aguardam decisão do ministro. Todas chegaram a seu gabinete a partir da segunda quinzena de abril, mas o única convertida em alvará de soltura, nesse período, foi a de seu ex-chefe e ex-ministro José Dirceu.

Arthur Rocha, o preso cego de Presidente Venceslau, é a prova provada da lentidão em processos de réus desconhecidos que chegam ao gabinete de Gilmar Mendes. O réu ingressou com o pedido em 22 de maio, mas lá ficou, sem qualquer andamento. Enquanto muitos amargam a lentidão no Supremo, uma parcela de processos avança a toque de caixa. No mesmo período (citado linhas atrás), os 40 pedidos de liberdade levados a Gilmar Mendes por investigados da Lava-Jato do Rio tiveram andamento, e ao menos 22 resultaram na soltura dos presos.

O caso do já notório Orlando Diniz, ex-presidente da Fecomércio do Rio, é emblemático. Ele apresentou a petição em 30 de maio e recebeu decisão favorável no dia seguinte. De tão gritante, o despacho a jato originou um embaraço para Gilmar: como a Fecomércio figurou por anos como patrocinadora do IDP, o instituto do ministro, os investigadores levantaram suspeita sobre sua decisão e pediram seu impedimento para atuar em casos envolvendo Diniz.

Diogo Abreu, 20 anos, não teve o mesmo êxito do velho patrocinador do instituto do ministro-deus. Em fevereiro, foi abordado pela polícia em um bar no bairro do Brás, na capital paulista, e acabou preso em flagrante, acusado de participar do roubo de um celular e uma carteira. Está na cadeia desde então, embora seu pedido de habeas corpus tenha chegado ao gabinete de Mendes quinze dias antes do pedido de Orlando Diniz.

Auxiliar de serviços gerais em Tupã, interior paulista, Lucas Nunes, de 21 anos, é outro que integra a estatística dos processos travados. O jovem está preso há um ano, sem julgamento. Ele confessou ter participado de um assalto a uma loja e roubado R$ 110, duas garrafas de vinho e chocolates. Os outros dois acusados aguardam o processo em liberdade. Ao Supremo, a defesa Nunes alega excesso de prazo na prisão — argumento recorrente em casos da Lava-Jato. A propósito desse assunto, aliás, não é de hoje que Mendes, referindo-se às prisões ordenadas pelo juiz Sergio Moro, repete que o Supremo tem “encontro marcado” com as “alongadas prisões de Curitiba”. O pedido de Nunes, que não é de Curitiba, chegou ao gabinete do ministro em 12 de junho, mas nada aconteceu até hoje.

Às vezes, tem cinco ou dez habeas corpus e não são apreciados. E às vezes caem outros habeas corpus, como os da Lava-Jato, que são apreciados no mesmo dia. Mas o princípio da isonomia é de que todos são iguais perante a lei. Então todos merecem a mesma celeridade. Deveria haver uma ordem para apreciação, para que não pulassem alguns e nem selecionassem outros”, disse a CrusoéFábio Donadon, advogado de Nunes.

No gabinete de Toffoli, houve um caso semelhante ao de José Dirceu. O petralha, triplamente condenado, conseguiu um habeas corpus de ofício, embora tenha uma pena de 30 anos a cumprir. Graças a Toffoli, cujo voto na 2ª Turma do STF foi acompanhado por Lewandowski e Mendes, o criminoso deixou o presídio da Papuda, em Brasília, sem nem mesmo ser monitorado por tornozeleira eletrônica (medida cautelar imposta pelo juiz Sérgio Moro, mas prontamente revogada por Toffoli, conforme vimos nesta postagem).

O mesmo instrumento, chamado “reclamação”, foi usado por Felipe Gonçalves. Aos 20 anos, ele foi condenado a três anos de prisão em regime fechado — coisa que geralmente acontece quando a pena passa de oito anos. No local de sua prisão, foram encontradas 26 porções de maconha, 70 de crack e 47 de cocaína. Por crimes que tais, os envolvidos são enquadrados como pequenos traficantes, mas o juiz de primeira instância, mesmo reconhecendo que o réu era primário e não integrava organização criminosa, determinou que a pena fosse cumprida em regime fechado. Felipe, que está preso desde fevereiro, admite ser usuário de drogas, mas afirma que estava no local para comprar maconha, mas não para vender tóxicos. Ainda que sua pena tenha sido equivalente a um décimo da de Dirceu, ele não teve o mesmo sucesso do petista pilhado no Mensalão e no Petrolão, e começou a cumprir a sentença antes mesmo de o veredicto ser confirmado em segunda instância.

“É extremamente difícil conseguir um habeas corpus de ofício, como o concedido a José Dirceu. Eu não vejo isso quando o nome não é de relevância. Digo com toda a honestidade. Nem prescrição, que é matemático, se consegue de ofício”, afirma o advogado Wagner Tasca, que defende Felipe. O causídico pleiteava que seu cliente cumprisse os três anos em regime mais aberto ou semi-aberto, mas é claro que o pedido foi negado por Dias Toffoli. Afinal, no Brasil existem réus e réus.

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segunda-feira, 16 de abril de 2018

AINDA SOBRE A CIZÂNIA NO STF



A divisão dos brasileiros em alas pró e contra Lula, fomentada pelo PT e pelo sumo-sacerdote dessa seita do inferno, espalhou-se como metástase pela sociedade e civil e chegou à nossa mais alta corte, que está nitidamente dividida quanto à prisão em segunda instância ― Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli (e eventualmente Rosa Weber e Celso de Mello) são contrários, e Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux, a favor.

De 1941 a 1973, a prisão após a condenação em primeira instância era a regra geral. Isso só mudou com Lei Fleury ― criada sob medida para beneficiar o delegado do DOPS e notório torturador homônimo ―, a partir da qual primários e com bons antecedentes ganharam o direito de responder ao processo em liberdade até o julgamento em segunda instância. Em 2009, porém, o Supremo passou a entender que a ausência de eficácia suspensiva dos recursos extraordinário e especial não seria obstáculo para que o condenado recorresse em liberdade, e assim a prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente poderia ser decretada a título cautelar. Essa jurisprudência mudou em 2016, quando a Corte restabeleceu o entendimento anterior, ou seja, de que a possibilidade de início da execução provisória da pena condenatória após confirmação da sentença em segundo grau não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência. De acordo com essa diretriz interpretativa, a manutenção da sentença penal pela segunda instância encerra a análise de fatos e provas que assentaram a culpa do condenado, o que autoriza o início da execução da pena.

Nos últimos setenta anos, excetuando-se o período de 2009 a 2016, os criminosos eram presos após a condenação em primeira ou em segunda instância, como acontece na maioria das democracias do Planeta. A prisão após trânsito em julgado vigeu por míseros 7 anos, mas favoreceu uma miríade de condenados que podiam pagar honorários milionários a criminalistas estrelados para empurrar o processo com a barriga até o advento da prescrição. É nítido que ressuscitar esse entendimento não só beneficiaria o criminoso Lula, mas também um sem-número de empresários, executivos, altos funcionários e políticos apanhados (ou em vias de sê-lo) pela Lava-Jato e seus desdobramentos.

Gilmar Mendes foi um dos grandes defensores da prisão em segunda instância em 2016. Ao fundamentar seu voto, ele afirmou que mudar o entendimento vigente desde 2009 colocaria o Brasil no rol de nações civilizadas e ajudaria a combater a impunidade. “Não se conhece no mundo civilizado um país que exija o trânsito em julgado; em princípio, pode-se executar a prisão com a decisão em segundo grau”, argumentou o jurista mato-grossense, que assim rebateu o argumento de que a execução antecipada de pena violaria o princípio da presunção da inocência: “uma coisa é ter alguém como investigado, outra coisa é ter alguém como denunciado, com denúncia recebida, e outra, ainda, é ter alguém com condenação (...) o sistema estabelece uma progressiva derruição, vamos dizer assim, da ideia da presunção de inocência (...)”. Sete meses depois, o ministro viraria a casaca e passaria a deferir os pedidos de habeas corpus que lhe caíram no colo e a defender a prisão após a condenação em 3.ª instância (tese de seu colega petista Dias Toffoli, que também era favorável à prisão em segunda instância em 2016, como se pode ver neste vídeo).

A pergunta que se impõe é: “quantas vezes o sujeito precisa ser condenado para começar a pagar sua dívida com a sociedade?” Duas vezes, como acontece na maioria de países livres, civilizados e bem-sucedidos, são mais que suficientes, salvo melhor juízo. Se houver um erro na condenação em primeira instância, o juízo colegiado poderá repará-lo; se não o fizer, é porque não houve erro, e ponto final. Não quero dizer com isso que se deveria impedir os réus de apelar aos tribunais superiores, mas sim impedi-los de recorrer em liberdade, sob pena de eles virem a ser presos no dia de São Nunca.

Nosso sistema judiciário conta com quatro instâncias, e cada uma delas oferece uma vasta gama de chicanas ― para o gaudio dos criminosos e dos criminalistas que os defendem, que cobram gordos honorários para ingressar com toda sorte de embargos, visando empurrar o processo com a barriga até o advento da prescrição. A defesa de Luis Estevão ingressou com nada menos que 120 recursos até seu cliente finalmente ir para a cadeia, e a de Paulo Maluf protelou a prisão do réu por quase 40 anos ― o eterno deputado "rouba-mas-faz" foi preso em dezembro, mas mandado para casa, dias atrás, pelo ministro petista Dias Toffoli, que, alegando “razões humanitárias”, anulou a decisão denegatória do ministro Edson Fachin

Observação: A decisão de Toffoli, de substituir a prisão em regime fechado de Paulo Maluf por prisão domiciliar foi algo praticamente inédito, até porque contraria a Súmula nº 606 do STF, segundo a qual não cabe habeas corpus para o plenário de decisão de turma, ou do próprio plenário, proferida em HC ou no respectivo recurso.

O plenário terá de decidir se essa intercorrência foi um caso isolado ou se passará a ser corrente, bem como se Maluf deve ou não voltar para a cadeia. Até porque a decisão inusitada de Toffoli já está produzindo frutos ― coo é o caso de Lula, cujos advogados já pediram que a decisão de Fachin (de negar o habeas corpus) seja revista por outro ministro (talvez isso não faça sentido nesse caso, pois o HC de Lula foi negado pelo plenário, não por uma decisão monocrática do ministro-relator da Lava-Jato, mas se ficar decidido que um ministro pode desautorizar outro, estará declarada a guerra entre os integrantes da Corte).

Some-se a isso o fato de o recurso da defesa de Maluf ter sido baseado em embargos infringentes (já que a decisão de prender o turco lalau não foi unânime). Fachin entendeu que embargos não são cabíveis nas turmas, e vetou a pretensão, mas Toffoli aceitou o recurso. Se essa novidade for chancelada no plenário, as turmas passarão a julgar embargos infringentes, embargos de declaração, embargos dos embargos, enfim, todo tipo de chicana que ajude a protelar a decisão final.

Observação: O regimento do STF não prevê embargos nas turmas, como ficou claro no julgamento do mensalão, quando Joaquim Barbosa, então presidente da Corte, ponderou que os embargos infringentes deixaram de existir nas ações originárias dos tribunais superiores depois da edição da Lei nº 8.038/90. (O STJ, que foi criado depois da Constituição de 1988, não prevê esses embargos).

Quando essa questão for votada, o que deve ocorrer nesta quarta-feira, o ministro Barroso ficará numa posição delicada, pois foi favorável aos embargos infringentes no julgamento do mensalão, o que propiciou a revisão de penas impostas a réus como José Dirceu. Na sabatina do Congresso, Barroso dissera que, em teoria, os embargos não existiam mais, mas se contradisse ao julgar o caso concreto, e agora terá de assumir uma posição sobre o mesmo assunto, com repercussão no trâmite dos processos cuja objetividade ele próprio defende. 

Para encerrar esta novela (refiro-me à postagem, não ao HC de Malufembargos infringentes nas turmas do STF ou prisão em segunda instância), a cizânia que menciono no título decorre de uma divergência de entendimento sobre o que é o Estado de Direito e a defesa dos direitos individuais, e o que eu chamo de banda podre do Supremo é o grupo (por enquanto minoritário) contrário à prisão em segunda instância, segundo o qual a Lava-Jato, a “República de Curitiba” e o juiz Sérgio Moro abusam das prisões provisórias para pressionar os réus a negociar acordos de colaboração com a Justiça. 

O cabo-de-guerra da prisão em segunda instância pode ter um desdobramento ainda nesta semana, dependendo da decisão do ministro Marco Aurélio de encaminhar ou não à votação a liminar (ora rejeitada pelo PEN) que pede a suspensão das prisões em segunda instância até que o STF rediscuta o assunto e eventualmente modifique a jurisprudência. Contrapõem-se, portanto, os que querem a manutenção do status quo àqueles que querem retornar aos tempos da prisão somente após trânsito em julgado, que, agora incluindo embargos infringentes no julgamento das turmas, proporcionaria uma sequência interminável de recursos e fatalmente resultaria na prescrição da pena na maioria dos casos. 

Vamos continuar acompanhando.

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sexta-feira, 20 de abril de 2018

TRF-4 REJEITA O DERRADEIRO RECURSO DE LULA NA SEGUNDA INSTÂNCIA E MANTÉM A CONDENAÇÃO DE JOSÉ DIRCEU. STF JULGA HC DE MALUF


Na tarde de ontem, a 8.ª Turma do TRF-4 negou os embargos dos embargos de declaração que a defesa de Lula havia protocolado na semana passada, quatro dias após a prisão do criminoso.

Não bastasse o caráter nitidamente protelatório desse recurso, Cristiano Zanin, um dos advogados do molusco encarcerado, teve o desplante de pedir que o julgamento fosse adiado até que João Pedro Gebran Neto, relator do processo, voltasse de férias.

Mas a chicana não deu certo; o desembargador Nivaldo Brunei se declarou apto a votar e, como Victor Laus e Leandro Paulsen, rejeitou as maracutaias, encerrando a fase recursal de Lula no TRF-4, ao menos no que concerne à ação sobre o tríplex no Guarujá ― prováveis recursos ao STJ e STF terão de passar por essa Corte, que é responsável por verificar se os apelos atendem aos requisitos necessários ao recebimento e remessa aos tribunais superiores; no caso de interposição conjunta de recursos especial e extraordinário, após o juízo de admissibilidade os autos serão remetidos ao STJ, que julgará o recurso especial e remeterá o extraordinário ao STF.

Também na tarde de ontem o Regional de Porto Alegre apreciou os embargos infringentes de José Dirceu, manteve a condenação e determinou a execução provisória da pena com o esgotamento do processo na segunda instância. Em junho de 2016, o juiz Sérgio Moro havia condenado o guerrilheiro de festim a 20 anos e 10 meses de xadrez por corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa ― que o TRF-4 aumentou para 30 anos e nove meses de prisão. Os embargos infringentes foram interpostos porque houve divergência quanto a dosimetria ― o desembargador Leandro Paulsen estabeleceu 27 anos e 4 meses, enquanto o relator João Pedro Gebran, 41 anos e 4 meses. No acórdão, ficou definida a pena de 30 anos e nove meses, que foi mantida, nesta quinta-feira, pela 4.ª Seção do TRF-4, que é formada por 3 juízes da 7.ª turma e 3 da 8.ª turma

ObservaçãoDirceu foi preso preventivamente em agosto de 2015, mas o STF lhe concedeu um habeas corpus em maio do ano passado. Se os ministros não mudarem a jurisprudência vigente, ele será despachado de volta para a cadeia. Vale lembrar que o “guerreiro do povo brasileiro” foi condenado pela segunda vez na Lava-Jato, em março do ano passado, a 11 anos e três meses de reclusão (a ação se encontra em grau de recurso, que ainda não foi julgado pelo TRF-4), e se tornou réu pela terceira vez em fevereiro deste ano, por recebimento de vantagens indevidas da Engevix e da UTC em troca de contratos com a Petrobras.

Passando ao caso de Paulo Maluf, anteontem o plenário do Supremo iniciou os debates sobre seu pedido de habeas corpus, mas a sessão foi encerrada antes que todos os ministros proferissem seus votos. O julgamento foi retomado nesta quinta-feira, quando a maioria dos ministros decidiu que a defesa só pode recorrer da condenação numa das duas turmas do STF se, no julgamento, houver ao menos dois votos pela absolvição ― no caso de Maluf, a condenação foi por unanimidade.

Depois do intervalo, quando a discussão sobre a possibilidade de ministros desautorizarem monocraticamente seus pares ― como teria feito Dias Toffoli ao mandar Maluf para casa, contrariando a decisão do relator ―, Fachin jogou água na fervura concedendo “ex officio” (por iniciativa do magistrado, independentemente de pedido da parte) a prisão domiciliar ao réu, que está internado desde o último dia 6 no Hospital Sírio-Libanês. Vale salientar que a iniciativa de Fachin esvaziou o debate sobre a decisão monocrática de Toffoli (tomada, segundo o próprio Toffoli, com o ad referendum do relator e da presidente da Corte), que poderia levar à discussão da possibilidade de um ministro do STF derrubar a decisão de outro colega da Corte dentro de um processo penal ou uma investigação.

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domingo, 16 de setembro de 2018

TOFFOLI PRESIDENTE DO STF — E AGORA, JOSÉ?


Na última quinta-feira, José Antonio Dias Toffoli, aos 50 anos de idade, entrou para a história do STF como o ministro mais jovem a presidir a Corte (seu mandato irá até setembro de 2020, quando Luiz Fux assumirá o posto pelo próximo biênio). Para alguns, ele será um “conciliador”, enquanto outros o têm na conta de militante petista travestido de magistrado supremo. A quem assiste razão, só o tempo dirá. Mas o caminho que Toffoli trilhou até chegar onde chegou acende uma profusão de luzes vermelhas. A começar por sua nomeação para o Supremo, na vaga aberta com a morte do ministro do STF Menezes Direito, que causou surpresa, perplexidade e crítica, não só pela pouca idade do indicado, mas também por abrilhantarem seu “invejável currículo” duas reprovações em concursos para juiz de primeiro grau e uma total inexpressividade no meio jurídico. A rigor, suas credenciais eram ter sido advogado do PT, assessor da Casa Civil de José Dirceu e advogado-geral da União no governo do comandante máximo da ORCRIM (clique aqui e aqui para mais detalhes).

Observação: A indicação do “cumpanhêro” foi (mais) uma demonstração cabal da falta de noção de Lula sobre a dimensão do cargo de ministro. Sem currículo, sem conhecimento, sem luz própria, Toffoli limitava a prestar serviços prestados ao PT. Uma vez no Supremo, sem os laços com a rede protetora do partido ou com os referenciais do padrinho, ele buscou apoio em Gilmar Mendes — que é quem melhor encarna a figura do velho coronel político —, e uma vez consolidado no habitat, passou a emular os piores hábitos do novo padrinho ― a arrogância incontida, a grosseria, a falta de limites, o uso da autoridade da forma mais arbitrária possível.

Veja (surpreendentemente) elogiou o discurso de posse em que Toffoli falou em “convivência harmoniosa de diferentes opiniõesprecisamos nos conectar cada vez mais com o outro; afetividade; sensibilidade; empatia; voluntariado; gentileza e cordialidade com o próximo; amor; viralizar a ideia do mais profundo respeito ao outro, da pluralidade e da convivência harmoniosa de diferentes opiniões, identidades, formas de viver e conviver uns com os outros”. Particularmente, concordo com o historiador Marco Antônio Villa, para quem a cerimônia de posse foi patética (detalhes neste vídeo).

A “pacificação” do STF seria bem-vinda, já que a polarização político-partidária — fruto do nefasto “nós contra eles” fomentado por Lula e seus acólitos — dividiu os membros da Corte em “punitivistas” e “garantistas” e instaurou o dissenso entre eles. Prova disso são as votações plenárias terminarem frequentemente com o placar de 6 votos a 5 — não raro após debates acirrados entre Mendes e Barroso — e a avalanche de decisões monocráticas em total desacordo com o entendimento colegiado, sobretudo no que concerne ao cumprimento da pena após condenação em segunda instância. Só que a “Pax Toffoliana” não tem o espírito da democracia; pelo contrário: limita-se aos poderosos, que precisam antes da impunidade que da cidadania.  

Há quem defenda a rediscussão das famigeradas ADCs — que Cármen Lúcia evitou pautar enquanto ocupou a presidência do STF — como forma de minimizar a insegurança jurídica, mas o momento não poderia ser menos propício. Aliás, o próprio Toffoli demonstra ter consciência disso quando diz a interlocutores que “o caso Lula precisa decantar”. 

O tema é controverso e suscita discussões acaloradas entre defensores e detratores. A meu ver, o grande “xis” da questão é a nossa Justiça ter quatro instâncias e cada uma delas oferecer um amplo cardápio de apelos, recursos, embargos e chicanas protelatórias. Se a prisão em segunda instância voltar a ser debatida — como vem insistindo o ministro Marco Aurélio, relator das ADCs 43 e 44 —, Gilmar Mendes mudar seu voto e Rosa Weber não acompanhar o entendimento de Cármen Lúcia, Fachin, Barroso, Fux e Alexandre de Moraes, que são favoráveis à prisão em segunda instância, tudo voltará a ser como dantes no Quartel de Abrantes, quando a prescrição fulminava a expectativa de réus defendidos por criminalistas estrelados. 

A título de exemplo, os advogados de Luiz Estevão ingressaram com nada menos de 120 recursos até o ex-senador e empresário milionário ser finalmente encarcerado, e o eterno deputado Paulo Maluf só foi recolhido à Papuda depois de empurrar o processo com a barriga por intermináveis 17 anos (todavia, graças a uma decisão “humanitária” do ministro Dias Toffoli, o turco lalau foi beneficiado com a prisão domiciliar, onde passa muito bem, obrigado, em sua cinematográfica mansão no bairro dos Jardins (região nobre da capital paulista), a despeito dos alegados problemas seriíssimos de saúde.

Observação: De 1941 a 1973, a regra no Brasil era a prisão após a condenação em primeira instância. Sob a égide da ditadura militar, a Lei nº 5.941 ― que acabou ficando conhecida como como Lei Fleury, já que foi criada de encomenda para favorecer o delegado do DOPS e notório torturador Sérgio Paranhos Fleury ― alterou o Código de Processo Penal e garantiu a réus primários e com bons antecedentes o direito de responder ao processo em liberdade até o julgamento em segunda instância. A partir de 2009, talvez como consequência serôdia da nossa fantasiosa “Constituição Cidadã”, os condenados passaram a ser presos somente após o trânsito em julgado da sentença condenatória (o que na prática significa no dia de São Nunca), até que, em 2016, o STF restabeleceu a norma da execução da pena após a condenação em segunda instância. Assim, a prisão após trânsito em julgado vigeu por míseros 7 anos, mas favoreceu uma miríade de condenados com condições de pagar honorários milionários a criminalistas estrelados e postergar sua prisão até o advento da prescrição. Portanto, ressuscitar essa norma de exceção beneficiaria não só o pulha de Garanhuns, mas um sem-número de empresários, executivos, altos funcionários e políticos que foram apanhados pela Lava-Jato ou estão a caminho de sê-lo.

Voltando a Toffoli, sua posse reforça um discurso de que uma eventual vitória do pau-mandado de Lula não só abriria as portas da cadeia (aliás, Ciro Gomes também já admitiu publicamente a possibilidade de conceder um indulto ao criminoso de Garanhuns) como permitiria que o pulha vermelho voltasse a dar as cartas no Planalto, o que seria no mínimo funesto para este pobre país. Vale lembrar que a segunda sentença de Moro num processo envolvendo Lula deverá ser proferida ainda este ano, mas, por motivos que me parecem óbvios, somente depois do segundo turno das eleições.

Ao definir pauta do STF para a segunda quinzena deste mês, Toffoli preferiu evitar temas polêmicos e tratar de questões de impacto social e ambiental. Na primeira sessão sob seu comando, marcada para a próxima quarta-feira (19), serão discutidos o uso de aeronaves para o lançamento de substâncias químicas no combate ao mosquito aedes aegypti e uma lei estadual do Amapá que trata de uma licença ambiental única para atividades e empreendimentos de agronegócio. 

Como dito linhas atrás, tudo indica que o novo “guardião da pauta” não deverá contemplar, pelo menos por enquanto, as polêmicas ações que discutem a possibilidade de execução provisória de pena após condenação em segunda instância, até porque isso desgastaria (ainda mais) a imagem do tribunal em pleno período eleitoral. O lado bom de sua promoção, digamos assim, é que, ao assumir a presidência, Toffoli deixou de fazer parte da 2ª Turma da Corte, onde formava com Gilmar Mendes (*) e Ricardo Lewandowski o “trio assombro togado” que tantas derrotas impôs ao relator da Lava-Jato, ministro Edson Fachin. Com o retorno da ministra Cármen Lúcia, a maioria se inverte e a Turma deixa de ser o “jardim do Éden” dos criminosos assistidos por advogados estralados. Ou pelo menos é o que esperamos.

(*) Na última sexta-feira, Gilmar Mendes mandou soltar o ex-governador do Paraná e candidato ao Senado pelo PSDB Beto Richa, bem como sua mulher, Fernanda Richa, e outros 13 suspeitos de integrar esquema de propina, direcionamento de licitações de empresas, lavagem de dinheiro e obstrução de Justiça. Os advogados do tucano embasaram o pedido de habeas corpus no uso da prisão temporária em substituição à condução coercitiva. O purgante de toga entendeu que a ordem de prisão aparentava ser "manifestamente inconstitucional" e reconheceu "indicativos de que tal prisão tem fundo político, com reflexos sobre o próprio sistema democrático e a regularidade das eleições que se avizinham”. Dias antes, Mendes comentou a atuação de procuradores na operação que levou Richa à prisão e em ações apresentadas no mês passado à Justiça contra os presidenciáveis Fernando Haddad e Geraldo Alckmin. Na visão do conspícuo magistrado, teria havido “notório abuso de poder” porque ações como essas do Ministério Público, há semanas das eleições, interferem no processo eleitoral, o que “não é bom para a democracia”. Vamos ver quanto tempo ainda vai levar para o ministro-deus soltar Adélio Bispo de Oliveira, autor do atentado contra Jair Bolsonaro — aliás, se o candidato do PSL tivesse sido atendido pelo SUS, talvez já estivéssemos noticiando sua missa de sétimo dia).

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domingo, 6 de fevereiro de 2022

RESTAURE-SE O IMPÉRIO DA MORALIDADE OU LOCUPLETEMO-NOS TODOS! (PARTE VI)

TSE é historicamente condescendente com crimes eleitorais e vem postergando indefinidamente suas decisões, talvez por não ter estrutura nem disposição para atuar com a celeridade desejável. Em 2017, o ministro Gilmar Mendes, que à época presidia a Corte Eleitoral, foi o mentor da impostura travestida de julgamento da chapa Dilma-Temer e o responsável pelo voto de minerva que livrou a pele do então presidente por “excesso de provas”, como ironizou o relator do processo, ministro Herman Benjamim.

Fiel a seu estilo (que prefiro não comentar), o magistrado se empenhou pela anulação de condenações de réus da Lava-Jato como se travasse uma cruzada em defesa do império da impunidadeAliás, depois de um dos memoráveis bate-bocas com o semideus togado, o ministro Barroso disse à Folha: "No Supremo, você tem gabinete distribuindo senha para soltar corrupto, sem qualquer forma de direito e numa espécie de ação entre amigos.

Indicado para o STF em 2002 pelo então presidente FHCGilmar Mendes é a prova provada de que o grão-duque tucano deixou pelo menos duas heranças malditas (a outra foi a PEC da reeleição). Ele era defensor incondicional da Lava-Jato e inimigo figadal dos criminosos de colarinho branco enquanto os investigados eram Lula e políticos do PT. Foi ele, aliás, quem botou água no chope do ex-presidente quando Dilma o nomeou ministro-chefe da Casa Civil (com o nítido propósito de lhe restituir o foro privilegiado). Mais adiante, porém, passou a articular o sepultamento da prisão em segunda instância (que ele próprio defendia com unhas e dentes) e a conceder habeas corpus a quem fosse preso preventivamente pela força-tarefa de Curitiba.

Em 2016, ao fundamentar seu voto sobre a prisão em segunda instância, Gilmar anotou: "Não se conhece no mundo civilizado um país que exija o trânsito em julgado; em princípio, pode-se executar a prisão com a decisão em segundo grau [...] uma coisa é ter alguém como investigado, outra coisa é ter alguém como denunciado, com denúncia recebida, e outra, ainda, é ter alguém com condenação...". Em 2017, porém, passou a admitir publicamente que poderia mudar de posição se houvesse um novo julgamento.

Também em 2017, Mendes mandou soltar — não uma, mas três vezes — o empresário Jacó Barata Filho, tido como chefe da máfia dos ônibus no Rio. Apesar de os procuradores da Lava-Jato pedirem seu impeachment, o magistrado não se deu por impedido de julgar o caso: "O fato de ser padrinho de casamento da filha do acusado não se enquadra nas regras legais que determinam o afastamento de um magistrado para julgar uma causa em função de relação íntima com uma das partes".

Em 2019, quando a questão prisão em segunda instância voltou à pauta, Mendes votou contra, juntamente com Rosa WeberRicardo LewandowskiCelso de MelloMarco Aurélio Mello e o então presidente da corte, Dias Toffoli — que, como Gilmar, era favorável ao cumprimento antecipado da pena.

No Brasil, criminosos que têm cacife para bancar os honorários astronômicos cobrados por causídicos estrelados (caso dos políticos corruptos, que pagam os chicaneiros com dinheiro desviado do Erário) têm acesso a um formidável cardápio de recursos que lhes permite empurrar os processos com a barriga até que a prescrição impeça a punição ou até baterem as botas, o que ocorrer primeiro.

A título de exemplo, a defesa de Luiz Estevão ingressou com 120 recursos até o salafrário ser encarcerado, e Paulo Maluf só foi recolhido à Papuda depois de seu processo tramitar por quase duas décadas, mas bastaram alguns meses para ele ser posto em prisão domiciliar por uma decisão tomada de ofício de Dias Toffoli.

Por outro lado, são falsas as acusações veiculadas em redes sociais de que Gilmar Mendes jamais advogou, que bombou em concursos públicos e que foi alçado ao STF sem passar pelo crivo do Senado (crivo esse que é eminentemente protocolar, como vimos no post do dia 4, as únicas reprovações ocorreram há mais de um século, durante o governo de Floriano Peixoto).

O atual decano do STF graduou-se em Direito pela Universidade Federal de Brasília, onde iniciou o mestrado em Direito e Estado que concluiu na Alemanha (pena não ter ficado por lá). Também foi aprovado em 12° lugar para o cargo de Juiz Federal (1983-1984), em 4° lugar para o de Assessor Legislativo do Senado Federal (nomeação suspensa a pedido do candidato em 1984), em 1° lugar para o de Procurador da República (1984) e em 1° lugar para o de Professor Assistente (Direito Público) da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (1995). Sobre a sabatina na CCJ do Senado, ela realmente foi adiada, mas acabou acontecendo e o indicado, aprovado por 16 votos a 6 na CCJ e por 57 votos a 15 no plenário.

Quem ostenta no currículo duas reprovações em concursos para Juiz de primeira instância — ambas na fase inicial, na qual são testados os conhecimentos gerais do candidato — é o ministro Dias Toffoli, que foi nomeado para o STF graças aos “bons serviços prestados a Lula e ao PT”. Em sua trajetória até nossa mais alta Corte, Toffoli foi advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de SBC, consultor jurídico da CUT, advogado nas campanhas de Lula em 1998, 2002 e 2006 e subchefe para assuntos jurídicos da Casa Civil da Presidência e Advogado Geral da União. 

Abrilhantam também o invejável currículo de Toffoli o fato de ele não ter despido a farda de militante petista quando vestiu a suprema toga e ter ido buscar apoio em Gilmar Mendes, que é quem melhor encarna a figura do velho coronel político — ou, como bem o definiu J.R. Guzzo, “uma fotografia ambulante do subdesenvolvimento brasileiro, mais um na multidão de altas autoridades que constroem todos os dias o fracasso do país” —, de quem Toffoli absorveu a arrogância incontida, a grosseria, a falta de limites, o uso da autoridade da forma mais arbitrária possível e outros hábitos pouco elogiáveis.

Em 2019, a Receita Federal investigou a Faculdade da qual Mendes é sócio fundador e os honorários advocatícios de Guiomar Feitosa Mendes, esposa do ministro-deus (há também suspeitas de suposto favorecimento no julgamento de processos no STF, mas isso é outra conversa). A declaração de imposto de renda do casal vazou, e 18 pessoas, entre parentes e conhecidos, foram listadas como potenciais investigados no caso. 

Segundo matéria publicada na revista Época, a luxuosa vivenda do casal Mendes, que fica no Setor de Mansões à beira do Lago Paranoá, poderia se passar por um clube — a julgar pela piscina, com uma onça preta de cerâmica bebendo água e uma edícula cheia de boias coloridas em formato de macarrão — ou por uma fazenda urbana — com uma vista espetacular da cidade, árvores frutíferas, viveiros, patos, galinhas, cachorros, gatos, emas e até um pônei (dias antes, a revista eletrônica Crusoé publicou que os bens do casal totalizariam R$ 20 milhões, entre imóveis e bens espalhados pelo país.

Gilmar disse ser alvo de ataques desde que chegou ao STF e atribui o fato a seus posicionamentos críticos ao que considera excessos ilegais. Época discorreu sobre inúmeros casos em que ele atuou como “voz contrária a interesses diversos” (nas palavras do próprio). Sobre a esposa do ministro, a matéria menciona apenas que ela disse nunca ter tido problemas com a Receita, que é de família rica, que tem tudo declarado, que a investigação era um absurdo.

Não são esses detalhes da vida pregressa do ministro que me levam a lhe dedicar estas linhas, mas sua beligerância ao classificar de "inusitado" e "esdrúxulo" o episódio envolvendo a Equipe Especial de Fraudes da Receita Federal, que aponta indícios de corrupção, lavagem de dinheiro e tráfico de influência do ministro e da mulher. Depois que a revista Veja trouxe o assunto a conhecimento público, Gilmar cobrou providências do presidente do STF para apurar “eventual ilícito” cometido pelos auditores. 

Como Lula, o todo-poderoso de araque parece achar que está acima da lei. Ave, César!

Continua...