Falar bem a nossa língua não é para qualquer um – e escrever
é ainda mais complicado, especialmente por conta do “novo” acordo ortográfico
(vigente a partir de 2009) que visa homogeneizar o idioma em Angola, Brasil Cabo Verde, Guiné-Bissau,
Moçambique, Portugal, São Tomé e
Príncipe e Timor Leste. Felizmente, a
maioria dos
processadores de texto dispõe de recursos para identificação
de erros de ortografia e digitação, sílabas trocadas, palavras repetidas, etc.,
que geralmente podem ser configurados para atuar durante ou ao final da
composição do texto. No MS Word, por exemplo, clique em
Ferramentas >
Opções e, na
aba Ortografia e gramática, marque as caixas
Verificar
ortografia ao digitar e
Verificar gramática ao digitar – do contrário,
você precisará pressionar a tecla
F7 sempre que quiser revisar o texto.
Sempre que encontrar
uma palavra que não reconheça, o corretor ortográfico-gramatical consultará
seus dicionários (principal e personalizado, se houver) e exibirá uma lista de
termos ortograficamente semelhantes, destacando o que mais se aproximar do que
você digitou. Adicionalmente, ele oferece uma lista de sinônimos – que você
pode consultar dando um clique direito sobre o termo desejado e clicando em Sinônimos...
– e um verificador gramatical baseado em “linguagem natural”, que analisa o
texto e sinaliza possíveis inadequações gramaticais.
Observação: Problemas ortográficos são sublinhados em vermelho,
gramaticais, em verde, e de formatação, em azul; para ver uma lista de correções
sugeridas, dê duplo clique sobre o sublinhado. Para saber mais, abra o Word,
pressione a tecla F1 e digite ortografia no campo de busca para
visualizar uma vasta gama de sugestões adequadas á sua versão do programa.
Note que o Word não é
dono da verdade; a palavra final sobre o cabimento das correções é uma prerrogativa
do usuário – desde que ele conheça bem o idioma. Se for daqueles que dizem
(e escrevem), para MIM fazer, AO par (de um fato ou assunto) e entrega À
domicílio, por exemplo, que Deus nos ajude – risos.
Infelizmente, muita
gente costuma usar e abusar do pleonasmo vicioso (como em
entrar para dentro,
subir para
cima, etc.); “escorregar” na conjugação do verbo FAZER (que fica no
infinitivo sempre que expressa idéia de TEMPO, como em FAZ cinco anos, FAZ dois
séculos, FEZ 15 dias) ou do verbo HAVER no sentido de EXISTIR (o certo é HOUVE
muitos acidentes, DEVE HAVER muitos casos iguais, e por aí vai). Aliás, falando
no verbo HAVER, nunca diga HÁ dez anos ATRÁS, já que tanto HÁ quanto ATRÁS,
nesse contexto, indicam o tempo passado (o correto é dizer HÁ DEZ ANOS ou DEZ
ANOS ATRÁS, uma coisa ou outra). A propósito, sugiro visitar o
Blog do LUCIDREIRA, que traz 100 dicas preciosas para fugir desse e de outros erros
comuns, e para testar seus
conhecimentos, o site
EDUCAR
PARA CRESCER, onde você pode jogar o jogo dos 100 erros de português.
Para concluir, segue transcrição de um texto - do impagável
Diogo Mainardi - sobre o “novo” acordo ortográfico. Vale a pena ler até o final.
Eu sou um ardoroso
defensor da reforma ortográfica. A perspectiva de ser lido em Bafatá, no
interior da Guiné-Bissau, da mesma maneira que sou lido em Carinhanha, no
interior da Bahia, me enche de entusiasmo. Eu sempre soube que a maior barreira
para o meu sucesso em Bafatá era o C mudo. Aguarde-me, Bafatá!
Nossa linguagem
escrita está repleta de letras inúteis. A rigor, todas elas. Abolir o trema ou
o acento agudo de alguns ditongos deveria ser apenas o primeiro passo para
abolir o resto do alfabeto. Se os italianos decidissem abolir a linguagem
escrita, perderiam Dante Alighieri. Se os brasileiros decidissem abolir a
linguagem escrita, conseguiriam libertar-se de José Sarney.
José Sarney idealizou
a reforma ortográfica em 1990. Ela foi escanteada por praticamente duas décadas,
até que Lula a sancionou. A posteridade se recordará da reforma ortográfica
como a grande obra de José Sarney, ao lado da emenda parlamentar que permitiu
ampliar o aeroporto internacional do Amapá para o atendimento de 700 000
passageiros.
Para os brasileiros, a
reforma ortográfica tem um efeito nulo. Ninguém sabia escrever direito antes
dela, ninguém saberá escrever direito depois. O caso dos portugueses é mais
complicado. Eles concordaram em abrasileirar sua ortografia. Isso acarretou a
necessidade de abdicar de um monte de consoantes duplas herdadas do latim.
Alguém ainda se lembra de José de Anchieta? Quando ele desembarcou no Brasil,
abdicou do latim e passou a rezar em tupi, para poder se comunicar com os
canibais. Foi o que os portugueses, mais uma vez, concordaram em fazer agora:
para poder se comunicar com os canibais - Quem? Eu? -, adotaram sua língua.
Eu entendo
perfeitamente o empenho dos brasileiros em deslatinizar a língua escrita. De
certo modo, o latim representa tudo o que rejeitamos: os valores morais, o
rigor poético, o conhecimento científico, o respeito às leis, a simetria das
formas, o pensamento filosófico, a harmonia com o passado, o estudo religioso.
Ele encarna todos os conceitos da cultura ocidental que conseguimos abandonar.
Eliminando o C e o P de certas palavras, Portugal poderá se desgrudar da Europa
e ancorar na terra dos tupinambás.
Eu já enfrentei outra
reforma ortográfica. Em 1971, durante a ditadura militar, Jarbas Passarinho,
por decreto, cancelou uma série de acentos. Além do Brasil, só a China de Mao
Tsé-tung pensou em fazer duas reformas ortográficas em menos de quarenta anos.
Quando a reforma ortográfica de Jarbas Passarinho foi implementada, eu acabara
de me alfabetizar. O resultado desse abuso foi despertar em mim uma salutar
ojeriza pela escola. Nos anos seguintes, a única tarefa didática que
desempenhei com interesse foi me lambuzar com cola Tenaz e, depois de seca,
despelá-la aos pedacinhos. Meus amigos fizeram o mesmo. O analfabetismo causado
pela reforma ortográfica de 1971 - e pela cola Tenaz - impediu que muitos de
nós nos transformássemos em algo parecido com José Sarney. Espero que a reforma
ortográfica de 2008 tenha um resultado semelhante. Em Carinhanha e em Bafatá
Um ótimo dia a todos.