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sexta-feira, 26 de abril de 2019

DE VOLTA À SUPREMA INFÂMIA



Lá do mundo da Lua, onde o som não se propaga e as críticas não ecoam, Dias Toffoli, encantado com a ausência de redes sociais, de procuradores e de jornalistas, abriu de ofício um inquérito sigiloso para transportar o STF para esse cenário idílico, mas errou o caminho e acabou levando a corte à suprema auto desmoralização. 

Agora, a prioridade dos demais ministros é trazer seu presidente de volta do espaço. Toffoli está brigado com a Constituição, mas espera-se que volte a respeitar pelo menos a lei da gravidade, reaprendendo que as encrencas sempre caem na cabeça de quem se coloca embaixo delas. Mas as declarações daquele que o empreiteiro-presidiário Marcelo Odebrecht revelou ser “o amigo do amigo de meu pai” (pai dele) indicam que não será fácil recolocar os pés supremos de sua excelência na Terra, já que seu alheamento atingiu um grau que beira o delírio.

Toffoli cultivava a ilusão de que preside e a fantasia de que a censura teria o respaldo da maioria dos seus pares. "Sou presidente do Supremo", declarou. "Eu sei exatamente a correlação de forças que tem lá, porque todo colegiado é plural. […] As decisões tomadas pelo ministro Alexandre de Moraes têm respaldo da maioria." Àquela altura, faltava-lhe o respaldo do próprio Moraes, relator do inquérito secreto aberto para conduzir o Supremo a um mundo isento de críticas, e que suspenderia a censura horas depois. Além das críticas de Marco Aurélio, caiu-lhe sobre a calva uma nota do decano Celso de Mello pró-liberdade de imprensa. O texto continha o peso do endosso de mais da metade da Corte.

Noutra evidência de que está fora da órbita da Terra, Toffoli passou a esgrimir nos últimos dias a teoria segundo a qual a Lava-Jato é obra do Supremo. Nessa versão, a maior operação anticorrupção já realizada na história só existe porque a suprema corte firmou dois "pactos republicanos" — um sob a presidência de Nelson Jobim, em 2004; outro sob o comando de Gilmar Mendes, em 2009.

Jobim não é propriamente um entusiasta da Lava-Jato, que encrencou muitos dos seus amigos. Gilmar tornou-se, ao lado de Toffoli, um adepto da política de celas abertas. Refere-se aos procuradores como "gentalha", "gente desqualificada", "despreparada", "covarde", "gangsteres", "cretinos", "infelizes" e "reles". Acha que eles "integram máfias, organizações criminosas". Considera que "força-tarefa é sinônimo de patifaria".

No mundo da fantasia de Toffoli, "todos nós somos a favor do combate à corrupção, de passar o Brasil a limpo, todos nós somos a favor de que quem desvia dinheiro público seja investigado e condenado. E cumpra a sua pena". No mundo real, gente como José Dirceu, corrupto reincidente, está em liberdade graças a uma decisão 2ª Turma, com os votos favoráveis de Toffoli e Gilmar. Guindado à presidência do Supremo graças a um sistema de rodízio que não leva em conta a qualificação, Toffoli permanecerá no posto até setembro de 2020. Se não for contido, é tempo suficiente para consolidar o suicídio institucional.

As decisões mais recentes de Toffoli indicam que ele tomou gosto pelo comportamento de alto risco. Muita gente está empenhada em chamar a sua atenção — dentro e fora da corte. Mas quanto mais o criticam, mais desmoralizado ele se empenha em ficar. Toffoli ama o desastre. E é plenamente correspondido. Mas não é recomendável dizer isso em voz alta. Aí mesmo é que o hipotético comandante do supremo e seu relator predileto podem atear fogo às próprias togas, chamuscando ainda mais a corte.

Resta confiar na sobriedade e na responsabilidade da maioria do Supremo. Não há tempo a perder. Ou fica claro, nos próximos dias, que o inquérito secreto viajará do mundo da Lua para o arquivo, ou o delírio supremo de Toffoli será convertido num processo de autocombustão do próprio STF.

Com Josias de Souza

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

O BRASIL ENTRE A CRUZ E A CALDEIRINHA



Nicolás Maduro rompeu relações diplomáticas com Bogotá no último sábado, depois de soldados venezuelanos dispararem balas de borracha e atirarem bombas de gás contra manifestantes que, na fronteira, exerciam pressão para garantir a entrada da ajuda humanitária que se deslocou em caminhões da Colômbia. Juan Guaidó, que dezenas de países reconhecem como o presidente interino da Venezuela, busca contribuições da Colômbia, do Brasil e também de Curaçao para enfrentar a profunda crise econômica e a escassez sofrida pela nação petroleira. Maduro está cavando a própria sepultura. E não vai "vai cair de maduro", se me permitem o trocadilho, mas de podre. Enfim, sigamos em frente.

Nos filmes das décadas de 50 e 60, jornaleiros (geralmente meninos) postavam-se nas esquinas e, ao gritos de “Extra!”, “Extra!”, apregoavam edições extraordinárias com manchetes bombásticas. Também era comum vermos o editor do jornal — quase sempre careca e com um charuto meio mastigado no canto da boca — mandado "parar as rotativas" diante de um furo de reportagem. O que isso tem a ver com a postagem de hoje? Nada. Mas essas imagens me cruzaram à mente quando li uma manchete “quase epifânica” publicada pelo Estadão: EX-ASSESSOR DE FLÁVIO DAVA PARTE DO SALÁRIO PARA QUEIROZ!!! (para ler a matéria, clique aqui )

Quer dizer, então, que havia mesmo pedágio no gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj? Nossa! Só faltou dizer isso é um fato inédito — como sabemos, a despeito de ser ilegal e imoral, o pedágio é uma prática quase tão velha quanto a própria política. Aliás, política e lisura, se não são conceitos mutuamente excludentes, são tão imiscíveis quanto óleo e água. Mas no país do futuro que nunca chega a corrupção se institucionalizou a tal ponto que, como diria minha avó, “contando, ninguém acredita”. Basta uma rápida pesquisa no Google para ver quantos deputados e senadores que estão no Congresso deveriam estar atrás das grades (e só não estão devido ao empenho de alguns de nossos ministros supremos em preservar o instituto da impunidade).

O descrédito em relação à política e aos políticos não vem de hoje e tampouco é exclusividade tupiniquim. Mas, aqui, sempre que surge uma luz no fim do túnel, ou é miragem, ou é o farol da locomotiva. Em maio de 2016, achamos que o afastamento da anta sacripanta poria um ponto final nos 13 anos, 4 meses e 12 dias de corrupção lulopetista. Mas alegria de pobre dura pouco: o ministério de notáveis prometido pelo vice promovido a titular não tardou a se revelar uma notável agremiação de corruptos. O hoje ex-senador Romero Jucá — que, a exemplo de Renan Calheiros e outros mais, encarna tudo o que não presta na “velha política” — durou uma semana e meia no comando da pasta do Planejamento. Na sequência, caíram Fabiano Silveira (que durou 18 dias no Ministério da Transparência) e Henrique Eduardo Alves (35 dias na pasta do Turismo).

Outros ministros foram caindo feito moscas, a razão de um por mês, em média, até que o vampiro do Jaburu, pego no contrapé pela gravação de sua conversa nada republicana com o açougueiro que ficou bilionário durante as gestões de Lula e Dilma, mandou às favas os escrúpulos, despiu a fantasia de virtuoso e torrou seu considerável capital político na compra do apoio das marafonas do parlamento para sepultar as denúncias apresentadas contra si pelo então procurador-geral Rodrigo Janot. Isso depois de ter afirmado enfaticamente que, litteris: 

A investigação pedida pelo Supremo Tribunal Federal será território onde surgirão todas as explicações, e no Supremo demonstrarei não ter nenhum envolvimento com estes fatos. (...) Não renunciarei. Repito. Não renunciarei”.

Como não poderia deixar de ser, Temer se tornou refém da Câmara dos Corruptos e, vergado sob o peso de uma impopularidade sem precedentes, terminou seu mandato-tampão como um “lame duck” (ou pato manco, que é como os americanos se referem a políticos que chegam ao fim mandato desgastados a ponto de os garçons palacianos demonstrarem seu desprezo servindo-lhes o café frio).

Em 2018, durante o primeiro turno da eleição presidencial mais conturbada da história desta Banânia, nosso “esclarecidíssimo eleitorado” (entre aspas e com todas as ironias de estilo) descartou os insossos candidatos “de centro”, ignorou (felizmente) aberrações como o Cabo Daciolo, Guilherme Boulos, Vera Lucia e afins e convocou os dois “extremados” para disputar o segundo turno. Diante da perspectiva nada alvissareira de o Brasil voltar a ser governado pelo PT e seus satélites — desta feita a partir de uma cela de prisão, no melhor estilho comandante-em-chefe do PCC —, milhões de não-eleitores de Bolsonaro ficaram sem alternativa que não se aliarem aos bolsomínions.

Claro que ninguém (ninguém minimamente racional, bem entendido) acreditaria que o deputado-capitão, com quase 30 anos de janela na Câmara Federal, tivesse um passado ilibado como o da Madre Tereza de Calcutá. Mas poucos imaginavam que seu governo viria a ser sistematicamente desestabilizado pelo “fogo amigo” disparado pelos “príncipes herdeiros”, que usam suas contas no Twitter como metralhadoras giratórias sem controle. Ou que o Presidente em pessoa fosse dado a enxergar complôs e deslealdades em cada esquina.

Desde a campanha que Bolsonaro reclama de supostas conspirações orquestradas por inimigos declarados e imaginários. Empossado, passou a desconfiar de traições também de integrantes graduados do governo. Como se não bastasse, mostrou-se inabilidoso em momentos de crise: a demissão de Bebianno, que contou com a participação decisiva de zero dois, só ganhou relevância graças à maneira canhestra com que o Presidente tratou o caso (quando bastaria ter "tirado as crianças da sala e dado ouvidos aos adultos", se é que me faço entender). Nos primeiros dez dias de governo, ele fez três anúncios públicos que logo foram corrigidos por seus auxiliares, e enfileiro declarações desencontradas sobre a mudança da embaixada brasileira em Israel, a instalação de uma base militar americana no Brasil e a extinção da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

No episódio gerou a crise “que só não existiu no 'mundo real' do ministro da Justiça e Segurança Pública”, pouco importa se Carluxo fez “macumba psicológica”, se agiu envenenado pelo ciúme, deslumbrado pelo poder ou ressentido por não ter ganhado um cargo no governo. O que preocupa é a inabilidade demonstrada pelo Presidente e pelo alto escalão do governo para lidar com a situação, e, por que não dizer, o arrepiante déjà-vu proporcionado pela demissão de um ministro depois de míseros 48 dias no cargo, e, pior, de o pivô desse salseiro não ser a oposição, mas um dos “príncipes herdeiros”, que, num passe de mágica, transformou o advogado, articulador da campanha, factótum e amigo do peito do pai em homem-bomba com potencial para jogar um trem de merda no ventilador e apontá-lo para o núcleo do governo.

O Planalto afirma que isso é página virada, que a questão foi superada, e que a Velhinha de Taubaté já psicografou um post dizendo que acredita. Tomara que ela esteja certa. Errar faz parte do aprendizado, mas quem não aprende com os erros que comete está fadado a repeti-los. E insistir no erro esperando que uma hora ele se transforme em acerto é a melhor definição de cretinice que eu conheço.

É por essas e outras que os brasileiros de bem perderam a fé na política e nos políticos. Claro que isso não se aplica aos devotos da seita do inferno, cuja fidelidade canina ao presidiário de Curitiba não lhes permitiria raciocinar nem se tivessem um mísero par de neurônios funcionais. Mutatis mutandis, o mesmo se pode dizer dos defensores atávicos de Bolsonaro, dada a dificuldade que eles têm de perceber que algo cheira mal no reino da Dinamarca, ou melhor, no Palácio do Planalto. Para os demais, fica difícil levar a sério um Congresso que funciona de terça a quinta e só reúne quórum quando a pauta interessa diretamente aos nobres congressistas. Onde deputados — supostamente representantes do povo — se comportam como galos de rinha durante as sessões, formando blocos fisiologistas e clientelistas, sem qualquer viés ideológico, para aprovar ou derrubar projetos em troca de cargos, verbas e emendas parlamentares.

E o que dizer do Judiciário — o derradeiro depositário das nossas esperanças —, se ministros supremos se digladiam diante das câmeras e promovem barracos que constrangeria até as marafonas de um puteiro de quinta classe? Salvo raras e honrosas exceções, suas excelências têm deixado claro que priorizam os próprios interesses e, se calhar, concedem parte de seu precioso tempo, como quem atira migalhas aos pombos, às questões que realmente interessam à nação. Depois, quando são confrontados pelos cidadãos inconformados em ver criminosos condenados deixarem a cadeia pela porta da frente (caso de Jacob Barata, Paulo Maluf, José Dirceu e tantos outros), zombando da lei e escarnecendo da população que roubaram descaradamente por anos a fio, mandam a PF prender os insurrectos — como fez Ricardo Lewandowsky em dezembro do ano passado, ao sentir “ofendido” pelo advogado Cristiano Caiado Acioli (durante um voo de São Paulo para Brasília), embora o “ofensor” tivesse apenas exercido seu direito constitucional de dizer como se sentia em relação ao STF e a vergonha que tinha de ser brasileiro.

Isso nos leva a Gilmar Mendes, o superministro supremo e autodeclarado representante de Deus na Terra, que, se não bastassem os péssimos serviços que preta à nação, vem atirando contra tudo e contra todos depois que a Receita Federal apontou indícios de lavagem de dinheiro nas movimentações financeiras dele e de sua digníssima esposa. 

Para não encompridar ainda mais esta matéria, os detalhes ficam para amanhã (a quem interessar possa, eu já publiquei algumas considerações interessantes sobre os ministros do Supremo — para acessá-las, clique aqui e aqui).

sábado, 1 de dezembro de 2018

O ESTREBUCHAR DE UM GOVERNO FISIOLOGISTA E CORRUPTO E A NOVELA DO “INSULTO DE NATAL”


Falta um mês para Michel Temer dizer adeus ao Planalto e do Jaburu (ele jamais quis morar no Alvorada porque, dizem as más-línguas, tem medo de assombração), depois de 2 anos e 7 meses no timão da Nau dos Insensatos. No livro de memórias que porventura venha a escrever (sobretudo se a Justiça lhe conceder bastante tempo ocioso), é provável que não mencione as três oportunidades de prestar um serviço inestimável à nação que ele teve nas mãos, mas deixou escapar. Então, façamo-lo nós.

Mesmo sendo o grande articulador e o maior beneficiário da impeachment da anta vermelha, Temer poderia ter declinado da Presidência. Não o fez, e, verdade seja dita, poucos em seu lugar tê-lo-iam feito. Mas o castigo veio a cavalo — ou em lombo do jegue, pois nossa Justiça tem 4 instâncias, nosso Congresso é dominado por corruptos e nossa Suprema Corte, por aberrações (mais detalhes nesta postagem). 

Embora a substituição da Rainha Bruxa do Castelo do Inferno pelo Vampiro do Jaburu  tenha sido uma lufada de ar puro após 13 anos, 4 meses e 12 dias de clausura lulopetista, os sinais de tempestade surgiram logo depois, quando o prometido ministério de notáveis se revelou uma notável confraria de corruptos. Mas o castelo de cartas ruiu de vez quando Lauro Jardim revelou detalhes de uma conversa pra lá de suspeita entre o presidente e certo moedor de carne com vocação para delator — e burro a ponto de delatar a si mesmo —, o que nos leva à segunda oportunidade de fazer um bem ao país, que sua excelência não aproveitou.

Diante da repercussão das revelações bombásticas, o presidente cogitou de renunciar, mas foi demovido da ideia por sua entourage. Assim, despido de vez do manto da moralidade, afirmou em pronunciamento à nação que não renunciaria, e que a investigação no Supremo seria “o terreno onde surgiriam as provas de sua inocência”. Ato contínuo, lançou mão de toda sorte de artimanhas para escapar da cassação. Mas o diabo sempre cobra sua parte no pacto: Temer tornou-se refém do Congresso, e isso foi o começo do fim.

O presidente pato-manco decidiu sair cena exatamente como entrou. Em 2016, ele autorizou seus apoiadores no Congresso a aprovar um pacote de reajustes que engordou os contracheques de 38 carreiras do funcionalismo; agora, desprezando sua derradeira chance de se redimir aos olhos da população, sanciona o vergonhoso reajuste salarial autoconcedido pelos ministros do STF e avalizado pelo Congresso de Eunício Oliveira, a despeito de as contas públicas estarem em petição de miséria. 

Se o presidente Temer fez o que fez porque a Lava-Jato inseriu em sua biografia duas denúncias criminais e dois inquéritos por corrupção, isso é ele quem deve dizer. O fato é que, tão logo desça a rampa do Planalto, em 1º de janeiro, o cidadão Temer poderá receber a qualquer instante uma visita matutina dos agentes da Polícia Federal.

Voltando à novela do “insulto de Natal”: No final de 2016, Temer estabeleceu que só poderiam ser beneficiados condenados a no máximo 12 anos que não fossem reincidentes e que tivessem cumprido um quarto da pena até 25 de dezembro daquele ano. Em 2017, já desacreditado e desmoralizado, sua excelência, sem motivo de jogar para a torcida, assinou um decreto ainda mais benevolente. Raquel Dodge (que foi escolhida pelo próprio Temer para comandar a PGR) entrou com uma ação no Supremo para suspender os efeitos daquele descalabro — que, segundo ela, resultaria em impunidade para crimes graves, sobretudo os apurados no âmbito da Lava-Jato e de outras operações de combate à “corrupção sistêmica”. 

A então presidente do STF decidiu suspendeu os pontos questionados no processo, o ministro Luís Roberto Barroso foi sorteado relator de processo, e assim, com a celeridade típica da nossa suprema corte, só agora, às vésperas da troca do comandante-em-chefe desta Banânia, os ministros resolveram se debruçar sobre o assunto. A propósito, Bolsonaro postou no Twitter que foi eleito presidente para atender aos anseios do povo brasileiro, que pegar pesado na questão da violência e criminalidade foi um dos seus principais compromissos de campanha, e que, se houver indulto para criminosos neste ano, certamente será o último.

O julgamento começou na quarta-feira 28, mas foi adiado (devido “ao avançado da hora”) quando o placar estava empatado em 1 a 1, e novamente suspenso na sessão subsequente, desta vez por um pedido de vista do ministro Luiz Fux, quando o placar estava em 6 a 2 a favor da permissão para que o presidente da República possa indultar quem ele quiser, sob qualquer critério.

Em tese, o pedido de vista se destina a dar mais tempo para o magistrado estudar o processo e formar seu entendimento, mas é largamente utilizado para obstruir a votação. Essa prática foi introduzida como estratégia pelo então ministro Nelson Jobim, que a trouxe de sua experiência no Congresso, onde a obstrução é uma arma da maioria para se fazer ouvir ou impedir algum ato do governo, e acabou sendo useira e vezeira no STF

Pelo regimento interno da Corte, a devolução dos autos deve ser feita até a segunda sessão subsequente à do pedido de vista, mas ninguém se atém a isso, de modo que, na prática, não existe prazo. Assim, o autor do pedido de vista pode devolver o processo somente quando vislumbrar a possibilidade de um ou mais magistrados mudarem o voto, ou quando a maioria formada já não fizer mais diferença. E é isso que deve acontecer agora.

O impasse na sessão de quinta-feira ocorreu duas vezes, pois também seu presidente, ministro Dias Toffoli, achou por bem pedir vista quando se formou maioria pela manutenção da liminar que impediu Temer de indultar os acusados de crimes do colarinho branco. A manobra de votar separadamente — primeiro a liminar, depois votar o mérito — foi proposta por Gilmar Mendes (sempre ele!); se a liminar fosse derrubada, Temer ficaria livre para dar o indulto à sua maneira, e a discussão do mérito não teria mais nenhum valor.

Mendes, Toffoli e o próprio Temer foram vítimas do próprio veneno: em novembro do ano passado, seguindo um roteiro previamente combinado com o presidente numa reunião fora da agenda, Toffoli impediu que a decisão majoritária do plenário da Corte reduzisse o foro privilegiado dos parlamentares, e Mendes fez o mesmo durante o julgamento do financiamento de campanha dos políticos. 

Fato é que o pedido de “vista obstrutivo” quase sempre tem um “motivo oculto” — como no caso de Toffoli, na questão do foro privilegiado, e de Mendes, no financiamento das campanhas. Na sessão de quinta-feira, Fux fez uma “defesa constitucional” do Supremo ao evitar que o indulto de Natal representasse um presente de Papai Noel para políticos e empresários condenados por crimes de corrupção, impedindo que políticos como Eduardo Cunha e Geddel Vieira Lima fossem soltos pelo “insulto presidencial”. 

Como faltam menos de 3 semanas para o início do recesso do Judiciário, o tema só deve ser retomado no próximo governo, e Jair Bolsonaro já disse que, com ele na Presidência, não haverá indulto de Natal.

segunda-feira, 13 de agosto de 2018

SOBRE DIAS TOFFOLI, O PRÓXIMO PRESIDENTE DO STF (TERCEIRA PARTE)


O Banco Mercantil do Brasil, fundado numa cidadezinha distante 160 km de Belo Horizonte e controlado desde a década de 1950 pela família Araújo, tem cerca de 1 milhão de correntistas e opera principalmente em Minas Gerais e no interior de São Paulo. Crusoé descobriu que a área técnica dessa instituição identificou indícios de lavagem de dinheiro nas transações envolvendo a conta do ministro Dias Toffoli, dentre as quais o fato de ela ser gerenciada pelo procurador Ricardo Newman — um ex-gerente de agências do Banco do Brasil em Brasília, que passou a assessor externo de Toffoli quando este foi nomeado Advogado-Geral da União e a assessor direto depois que o chefe ascendeu ao STF

Graças ao Mercantil, o magistrado também figurou em uma investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro. Os procuradores descobriram que o banco foi usado para repassar R$ 350 mil para Toffoli dar aulas na Universidade Gama Filho. Em uma decisão temerária e repleta de suspeitas, o enrolado Postalis — fundo de pensão dos funcionários dos Correios — havia escolhido a instituição para investir parte de seu dinheiro. Enquanto não recebia os aportes, era com dinheiro do Banco Mercantil que a Gama Filho pagava alguns de seus prestadores de serviço — um dos quais nosso caro ministro. Os valores eram repassados pelo Mercantil e, em seguida, transferidos para Toffoli; quando a universidade recebia os recursos do Postalis, ela ressarcia o banco.

Um dos citados na investigação é o empresário Ronald Guimarães, alvo de um processo que chegou ao STJ em 2014. Era uma causa de incríveis R$ 250 milhões, e o empresário, que já contava com Cezar Peluso — ex-presidente do STF — em sua equipe de defensores, contratou também os serviços de Roberta Maria Rangel. A ação segue em aberto, agora no Supremo e com outros advogados, no gabinete da ministra Cármen Lúcia.

Além de funcionar como relator de processos de interesse do Mercantil no STF, o ministro Dias Toffoli foi beneficiário de generosas operações autorizadas pela cúpula da instituição. Documentos internos obtidos por Crusoé revelam que, em 2011, ele pediu um empréstimo de R$ 900 mil, a ser pago em parcelas de R$ 13.806 ao longo de 15 anos. A prestação representava quase 75% do salário líquido que o magistrado percebia na época, mas o banco liberou o financiamento mesmo assim — e com uma taxa de juros de 1,35% ao mês (metade da taxa utilizada nas operações de crédito pessoal dos demais clientes).

Continua na próxima postagem.

Enquanto isso...

A menos de dois meses do pleito presidencial, o cenário nebuloso se torna ainda mais incerto quando se projeta um “pós-eleição” em que não há certeza de nada, senão de que a campanha sucessária vem sendo marcada como nunca pela escassez de líderes com visão de longo prazo e capacidade de infundir confiança no eleitorado e no empresariado.

A inequívoca a perda de legitimidade dos políticos — independentemente de vinculações partidárias — leva os eleitores a uma apatia jamais vista na história recente deste país. Para piorar, nomes antes promissores foram varridos do tabuleiro sem que novos líderes despontassem no horizonte. 

O resultado é o que se vê: uma população composta majoritariamente por analfabetos, desculturados, desinformados e desinteressados, não raro seduzidos por discursos populistas de supostos “salvadores da pátria” — só isso explica o fato de um criminoso condenado liderar as pesquisas de intenção de voto, de um extremista de direita vir logo atrás (detalhe: ao contrário do primeiro colocado, que está cumprindo pena por corrupção e lavagem de dinheiro, o segundo tem chances reais de assumir a Presidência, caso vença as eleições), seguido por um pseudo cearense que promete, num prodígio de magia, "limpar o nome" de dezenas de milhões de brasileiros inscritos no Serviço de Proteção ao Crédito.

Some-se a isso uma total incerteza quanto ao cenário “pós eleitoral”, dada a acentuada pulverização das forças políticas num contexto de elevada descrença e mau humor da população, com:

1) uma herança maldita, com renda per capita quase 10% inferior à de 2014 e quase 14 milhões de desempregados; 

2) um contexto externo bem menos favorável que o dos últimos anos, por conta da guerra comercial empreendida por Trump; 

3) a tensão permanente entre a população impaciente com a política e as práticas da maioria fisiológica num Congresso onde boa parte dos parlamentares é ou está em vias de ser investigada, processada e (queira Deus) condenada e presa; 

4) o acirramento dos conflitos em torno do orçamento público, com fortes demandas da sociedade por mais e melhores serviços, enquanto o apetite pantagruélico dos servidores e grupos políticos por recursos e privilégios só faz crescer; 

5) As incertezas quanto ao prosseguimento do combate à corrupção.

Em seus discursos de palanque, candidatos atacam as elites, os esquerdistas, os rentistas, a grande mídia, os banqueiros e a Fada do Dente, e prometem soluções fáceis e rápidas — mas impraticáveis —, induzindo o confronto, a divisão e o ressentimento e demostrando inequívoca propensão para o intervencionismo estatal, o autoritarismo, a indisciplina fiscal e o assistencialismo.

Nem sei mais o que dizer.

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segunda-feira, 25 de junho de 2018

SOBRE O STF, LULA E SUA PERMANÊNCIA NO XADREZ



Apesar da fama de festivo, o brasileiro anda com o desalento à flor da pele. E não é para menos. Temos um presidente com índices abissais de popularidade, um congresso corrupto e um eleitorado composto por apedeutas — dos quais mais da metade não sabe em quem votar para presidente, e o restante está dividido entre um criminoso condenado e um populista e despreparado.

O Brasil naufragou miseravelmente, mas Lula está na cadeia, e só isso já é motivo para a mais desenfreada euforia. Sobretudo depois de mais uma derrota de sua defesa, que pleiteava o efeito suspensivo da condenação imposta por Moro e ratificada pelo TRF-4. O julgamento da medida cautelar, que havia sido pautado para amanhã, foi cancelado na última sexta-feira pelo ministro Edson Fachin, depois que o TRF-4 negou seguimento ao Recurso Extraordinário do petralha (clique aqui para ler a íntegra da decisão de Fachin), alterando o quadro processual. 

Dias antes, a petralhada festejou a absolvição de Gleisi Hoffmann e de seu marido, o ex-ministro Paulo Bernardo, pela 2ª Turma do STF — a mesma que julgaria o pedido da defesa de Lula —, e muitos viram nessa decisão um prenúncio da libertação do molusco abjeto. Mas uma coisa é desmontar as denúncias de Rodrigo Janot e outra coisa é reverter uma pena imposta pelo juiz Moro e corroborada por todos os desembargadores do TRF-4 e todos os ministros do STJ. É esperado que os advogados de Lula recorram dessa decisão, mas o apelo só será apreciado no segundo semestre, pois o recesso do Judiciário começa já na próxima semana.

Vale lembrar que, em setembro, o petista Dias Toffoli sucederá à ministra Cármen Lúcia na presidência do Supremo, o que é preocupante. Por outro lado, ela assumirá o lugar de Toffoli na 2ª Turma, o “trio assombro togado” perderá um de seus membros — o que é providencial, pois as chances de as decisões de Fachin serem sistematicamente derrubadas por 3 votos a 2 serão reduzidas (saiba mais sobre as “sumidades supremas” clicando aqui e aqui).

Costumo dizer que a atual composição da nossa mais alta Corte é uma das piores de toda a história do Tribunal. Quando por mais não seja, porque 8 dos 11 ministros foram indicados por Lula e Dilma (as exceções são Marco Aurélio, Gilmar Mendes e o decano Celso de Mello, indicados, respectivamente, por Fernando Collor, Fernando Henrique e José Sarney.

Observação: Não quero dizer com isso que um ministro indicado por Lula ou Dilma vá necessariamente favorecer o chefão da ORCRIM e seus comparsas. Até porque o mínimo que se espera de um magistrado (de qualquer instância do Judiciário) são decisões isentas, desapaixonadas e desvinculadas de simpatias pessoais e preferências político-partidárias. Na prática, porém, a teoria pode ser outra, conforme a gente já viu em inúmeras ocasiões (basta lembrar a atuação de Lewandowski no julgamento do mensalão e, mais adiante, durante a votação do impeachment da anta imprestável).

Ao contrário do que se costuma imaginar, não é preciso ser inscrito na OAB ou mesmo bacharel em Direito para ser ministro do Supremo Tribunal Federal desta Banânia. Segundo o artigo 101 da Constituição, basta o candidato ser brasileiro nato, ter entre 35 a 65 anos, estar em pleno gozo de seus direitos políticos, possuir notável saber jurídico e reputação ilibada. Não se aplica ao Supremo, portanto, o quinto constitucional de que trata o artigo 94 da nossa atual Carta Magna, de modo que inexiste a obrigatoriedade de os ministros serem oriundos da magistratura, do Ministério Público ou da advocacia. Qualquer pessoa que preencha os requisitos retro citados poderá ocupar o cargo, desde que seja indicada pelo presidente da República e aprovada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, composta por 27 parlamentares.

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quarta-feira, 20 de junho de 2018

STF DEVE DEBATER EM AGOSTO A DESCRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO



A Câmara dos Deputados da Argentina aprovou no último dia 14, por 129 votos a favor, 125 contra e uma abstenção, o projeto de lei que descriminaliza o aborto. No Brasil, o tema será debatido nos dias 3 e 6 de agosto, em audiência pública convocada pela ministra Rosa Weber, do STF, a quem coube relatar a ação protocolada no ano passado pelo PSOL, questionando a constitucionalidade de artigos do Código Penal que preveem pena de prisão para mulheres que cometem aborto nos casos não autorizados por lei (atualmente, o aborto só é permitido em caso de estupro, de fetos anencefálicos, ou quando a gravidez oferece risco à vida da gestante).

Em 2016, por maioria de votos, a 1ª Turma do Supremo decidiu descriminalizar o aborto no primeiro trimestre da gravidez. Seguindo voto do ministro Luís Roberto Barroso, o colegiado entendeu que são inconstitucionais os artigos do Código Penal que criminalizam o aborto, mas a decisão valeu para um caso específico.

Paralelamente, uma Proposta de Emenda Constitucional em tramitação no Congresso desde 2015 visa proibir todas as formas de aborto no país, aí incluídos os casos considerados legais. Originalmente, essa PEC tratava da ampliação da licença-maternidade para mães com bebês prematuros, mas o relator resolveu incluir no texto que “os direitos constitucionais da dignidade da pessoa humana, da inviolabilidade da vida e igualdade de todos perante a lei devem ser considerados desde a concepção”— o que é visto pela oposição como uma manobra das bancadas evangélicas para reforçar a proibição do aborto no país.

Muitos defendem a proibição do aborto com base no argumento de que o embrião se torna um “ser vivo” assim que o óvulo é fecundado por um espermatozoide, mas essa interpretação nunca foi confirmada cientificamente. O entendimento mais bem aceito é de que o início da atividade elétrica do córtex central do embrião, que define o princípio da consciência mental, ocorre somente após a 20ª semana de gestação. Dessa forma, os abortos levados a efeito até a 12ª semana apenas interromperiam o crescimento de um ser inanimado.

É inadmissível, a meu ver, impor a toda a sociedade a posição dogmática de grupos religiosos, lastreados em conceitos filosóficos e/ou morais eminentemente abstratos. Demais disso, cumpre salientar que um aborto nunca é uma decisão aprazível, mas quase sempre o único caminho que se descortina para uma mulher em situação de vulnerabilidade extrema. Ao ignorarmos tal realidade, estaremos tolhendo o direito inegociável de qualquer ser humano, sobretudo das mulheres, de governar a própria vida.

Segundo a OMS, mais de 50 milhões de abortos são realizados por ano no mundo, e metade deles é executada de forma precária e insegura, notadamente em países que mantêm leis restritivas ao procedimento. No Brasil, a estimativa é de que 1,1 milhão de abortos clandestinos seja feitos anualmente, e que cerca de 11 mil mulheres morrem em decorrência de complicações no procedimento, sem mencionar que muitas mais ficam indelevelmente marcadas por sequelas psicológicas, esterilidade, lesões genitais incapacitantes ou infecções crônicas.

Leis restritivas só aumentam o número de procedimentos clandestinos e inseguros. Prova disso é que, de acordo com a ONU, em 52 países com leis liberais (quase sempre os mais desenvolvidos) o número de abortos e de mortes associadas ao procedimento é 90% menor do que em 82 nações (geralmente as mais pobres e subdesenvolvidas) que proíbem a intervenção. Nem é preciso dizer em qual categoria se enquadra a nossa Banânia. A pergunta é: o que esperar do futuro de uma gestação indesejada levada a cabo num país disfuncional como o nosso, senão uma legião indecente de crianças rejeitadas, condenadas a viver em ambientes carentes e hostis?      

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domingo, 20 de maio de 2018

AS ENTRANHAS DO SUPREMO E AS ATROCIDADES DE GILMAR MENDES



Dando sequência ao o “tour” iniciado na última quinta-feira, chegamos ao gabinete de Gilmar Mendes, no 5.º andar do anexo II do prédio do STF. O ministro é o único remanescente das nomeações feitas por FHC depois que Nelson Jobim e Ellen Gracie se aposentaram. Formado em Direito pela Universidade de Brasília, com doutorado na Alemanha e uma breve passagem pelo Itamaraty, ele ostenta, talvez, uma das mais sólidas formações entre a composição atual, mas se destaca mesmo é por sua belicosidade ― os embates que travou com Joaquim Barbosa e Marco Aurélio entraram para a história do STF, as recentes rusgas com Luís Roberto Barroso vêm superando as expectativas e suas decisões escalafobéticas disputando, dia sim outro também, espaço na mídia com os boletins do tempo e a cotação do dólar.

Em sua suposta “cruzada” contra as prisões alongadas da Lava-Jato, o superministro tem concedido habeas corpus a criminosos como Jacó Barata, Anthony Garotinho, Joesley Batista, José Dirceu e Roger Abdelmassih (apenas para ficar nos mais notórios). Só mesmo uma patologia jurídica explica essa sua determinação em contrariar o senso comum e desafiar os colegas com decisões monocráticas, como as que tomou na última semana ao mandar soltar Paulo Preto ― ex-diretor da Dersa que desviou R$ 113 milhões para paraísos fiscais ― e Milton Lyra ― lobista apontado como operador do MDB, e, no apagar das luzes da sexta-feira, mais quatro suspeitos de fraudar fundos de pensão e presos na Operação Rizoma.

A vocação para laxante e a propensão a afrontar o colegiado rendeu a Gilmar Mendes, somente no ano passado, meia dúzia de pedidos de impeachment. Desses, dois foram mandados para o arquivo por Eunício Oliveira antes mesmo que tivessem qualquer tramitação, e os demais, aí incluído o que foi respaldado num abaixo-assinado virtual com 1,7 milhão de apoios, dormitam nas gavetas da presidência do Senado. Semanas atrás, o jurista Modesto Carvalhosa protocolou mais um, mas cabe ao Senado julgar pedidos de impeachment contra ministros do Supremo, e como o número de parlamentares que já foram ou estão prestes a ser denunciados por práticas pouco republicanas não para de crescer, o ministro está pouco se lixando, confiante de que os pedidos continuarão sendo engavetados (ao menos até a próxima legislatura).

As recorrentes trocas acaloradas de opinião entre o Gilmar Mendes e Luiz Roberto Barroso chamam a atenção tanto pela virulência quanto pela circunstância ― inédita, pelo menos até onde a vista alcança ― de um membro da Suprema Corte tratar um colega por “você” (“me deixa de fora desse seu mau sentimento; você é uma pessoa horrível, uma mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia”, disse Barroso a Mendes).

Há uma cizânia no STF, e o fator desencadeador é a Lava-Jato, que provocou a ruptura em três níveis: o primeiro no piso térreo dos partidarismos, o segundo no piso intermediário da postura dos juízes em face das penas, e o terceiro no alto plano das concepções teóricas. No térreo, a dissenção no tribunal corresponde às dissenções na política e na sociedade. Mendes, Toffoli e Lewandowski são os ministros com currículo e atuação mais ligados à política e aos políticos. O primeiro trabalhou nos governos Collor e FHC e é próximo do governo Temer. O segundo foi consultor da CUT, assessor jurídico da bancada do PT na Câmara e, no governo Lula, subchefe de assuntos jurídicos da Casa Civil e Advogado Geral da União. O terceiro trabalhou junto à administração do PMDB (hoje MDB) na prefeitura de São Bernardo do Campo e no governo de São Paulo, e no julgamento do mensalão fez o contraponto ao rigor do relator Joaquim Barbosa ― nenhum deles admitirá que os vínculos e as preferências políticas interferem em sua atividade, mas é óbvio que eles são pessoas inseridas na sociedade, e como tal portadoras de preferências políticas.

Observação: O terceto fantástico se consolidou contra o que alega ser avanços indevidos e arbitrariedades da Lava-Jato. Ainda que Mendes se declare antipetista e os demais sejam próximas à petralhada, o acordo entre eles é “você salva os meus que eu salvo os seus”. No campo oposto ficam Fachin, Barroso, Fux, Cármen Lúcia e, eventualmente, Rosa Weber ― um grupo que partilha uma comunhão ideológica em prol de uma faxina na política e uma revolução no modo de fazer campanhas, atuar no parlamento e governar. Ambos os lados fazem seus lances de olho no lance seguinte, e Marco Aurélio, Celso de Mello e Alexandre de Moraes oscilam entre um campo outro.

No piso intermediário fica o garantismo ― diz-se garantista o magistrado que garante a liberdade do réu até a dissipação da derradeira dúvida, a exemplo do ministro Marco Aurélio. Também há os garantistas de ocasião, que só o são quando o réu não é de tendência política contrária, mas isso já é outra conversa. No plano mais elevado situam-se as concepções sobre a natureza e o alcance da Constituição e do STF, e os três níveis da discórdia se fazem presentes, misturados, nas votações de 6 a 5 ou, no máximo, 7 a 4 que têm caracterizado o normal das sessões plenárias. Nas duas turmas, calhou de o trio assombro ficar reunido na segunda, deixando Fachin isolado ou, vez por outra, apoiado pelo decano da Corte. Aliás, as turmas ficaram conhecidas por apelidos: a primeira, que absolve sempre, é o Jardim do Éden, a segunda, que condena, é a Câmara de Gás.

Em setembro, Toffoli assumirá a presidência da Supremo (perspectiva assustadora, mas real). Consola o fato de que ele deixará a segunda turma, e Cármen Lúcia, que hoje é a presidente, assumirá seu lugar. Quando nada, a vida do ministro relator da Lava-Jato ficará menos espinhosa.

Haveria muito mais a dizer, mas vejo agora que este texto já superou (em muito) a extensão que eu considero aceitável. Para não cansar ainda mais o leitor, encerro por aqui.

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quinta-feira, 12 de abril de 2018

O CLIMA NO STF E O IMPEACHMENT DO MINISTRO-DEUS



A sessão de ontem no STF não foi diferente das anteriores. Embora se esforçassem para disfarçar, as duas alas antagônicas deixavam transparecer a cada instante a desarmonia que reina na Corte, a exemplo da dicotomia maniqueísta que Lula e o PT institucionalizaram no país, com sua estapafúrdia cantilena do “nós contra eles”.

Gilmar Mendes ― que posa de semideus togado ―, está cada vez mais isolado. Tanto seus pares quanto a PGR vêm mantendo uma salutar distância de sua insolência, a quem restam Michel Temer e os petistas, que se aliaram estrategicamente a ele.

Com o indefectível dedo em riste, o olhar colérico e o beiço espichado como o de um botocudo, o superministro caga-regras permeou a sessão com intermináveis apartes. Parecia que seus “valiosos ensinamentos” eram uma epifania capaz de mudar os destinos da humanidade, e por isso deveriam ser sorvidos pelos demais ministros como água fresca por beduínos sedentos. Leda pretensão: seu ramerrão batido não mudou sequer a posição da ministra Rosa Weber ― e foi bom que tenha sido assim, pois uma guinada de 180° sobre a questão da prisão em segunda instância, pouco mais de um ano após o plenário estabelecer o entendimento ora em vigor, seria “apequenar o Supremo”, como vem observando a ministra Cármen Lúcia).

No final da tarde de ontem, o professor Modesto Carvalhosa protocolou um pedido de impeachment contra Mendes ― para quem não sabe, a famosa Lei do Impeachment (1079/50), que dispõe sobre os crimes de responsabilidade, seu processo de julgamento, autoridades que podem ser processadas e quem pode denunciar, explicita em seu Art. 2.º que ministros do STF podem ser processados (e condenados por crime de responsabilidade) pelo Senado Federal

Não é a primeira vez que Gilmar Mendes é alvo de um pedido de impeachment, mas eu não sei até que ponto isso produzirá efeitos práticos. Até porque nosso Congresso virou um antro de marginais (vamos ver o que muda com as eleições de Outubro, quando poderemos substituir os 513 deputados e 2/3 dos 81 senadores). Para Carvalhosa, que assina a peça com seus colegas Luís Carlos Crema e Laercio Laurelli, “é chegada a hora de impor limites, cobrar responsabilidade e exigir do ministro que exerça suas funções com respeito à Constituição”. Em post no Facebook, o jurista acrescentou que “os ministros não podem ser confundidos com pontas de lança de organizações criminosas comandadas por políticos profissionais, que Mendes tem exercido esse papel e, portanto, não pode continuar ministro do STF”.

O ministro Marco Aurélio morde e assopra ― embora venha mais mordendo mais que assoprando. ultimamente. Ao proferir seu infindável voto, sua excelência se travestiu de cartomante de feira e vaticinou que o placar seria de 5 a 5, como da vez anterior, ficando o desempate por conta do “Voto de Minerva” da presidente da Corte. Mas não eram precisos dons mediúnicos ou bola de cristal para alguém prever isso. Não depois que a sempre “misteriosa” ministra Rosa Weber proferiu seu voto.

Toffoli e Lewandowski fizeram o esperado, da mesma forma que o decano da Corte, que parece se deliciar com o som da própria voz. Já os ministros da outra banda ― como também era esperado ― seguiram o voto de Edson Fachin, o relator ― um dos poucos que não abusa do juridiquês empolado e ininteligível, de que alguns de seus pares parecem se valer para evidenciar seu “notável saber jurídico” ou disfarçar a falta de conteúdo, mas vamos deixar essa conversa para outra hora.

Depois de estabelecido o placar profetizado por Marco Aurélio, iniciou-se outro debate, desta feita para decidir se a Corte deveria ou não conceder “de ofício” o HC a Palocci ― o que seria possível se houvesse alguma ilegalidade na prisão do “paciente”. Alexandre de Moraes, Luiz Roberto Barroso e Luiz Fux seguiram o o voto de Fachin, pela não concessão do HC, e então a ministra Cármen Lúcia encerrou a sessão, que foi adiada para as 14h00 desta quinta-feira (aliás, acabou de começar, com a ministra Rosa Weber seguindo o voto do relator).

Aguardem, portanto, novas emoções.

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sexta-feira, 24 de novembro de 2017

CADEIA NELES! E LULA LÁ!


Nossas organizações políticas se tornaram quadrilhas que visam exclusivamente acumular riquezas e se perpetuar no poder. Seus membros, na esmagadora maioria, são políticos fisiologistas que moldam a legislação conforme suas conveniências, não raro blindando-a para impedir a renovação dos quadros. Ao impotente eleitor, resta a triste missão de comparecer às urnas a cada dois anos para legitimar a permanência dessa caterva no poder.

No nosso arremedo de democracia, o voto não baliza as ações do governo, apenas se limita, pleito após pleito e escândalo após escândalo, a manter tudo como está. E o resultado não poderia ser diferente do que vimos dias atrás, quando 3 deputados fluminenses, presos por notório envolvimento com a máfia dos ônibus, foram prontamente acudidos por seus cúmplices (39 dos 70 membros da ALERJ) e colocados em liberdade mediante uma discussão legal estapafúrdia, na qual os fatos não produzem consequências.

Foi o STF que, no mês passado, ao julgar uma ação direta de inconstitucionalidade impetrada pelo PP, pelo PSC e pelo Solidariedade, decidiu que medidas cautelares que suspendem ou prejudicam o exercício de mandato parlamentar devem ser submetidas às Casas legislativas em 24 horas. Com isso, abriu-se uma porta para o Senado reverter o afastamento do tucano Aécio Neves, a vergonha nacional, e criou-se o perigoso precedente que já trouxe de volta à vida pública, além dos 3 da ALERJ, deputados corruptos também no Rio Grande do Norte e no Mato Grosso.

Enfim, o TRF-2 mandou Picciani e seus cúmplices de volta para o xadrez, por não reconhecer a competência da ALERJ para anular a prisão original. Resta saber como se pronunciarão o STJ e o STF, já que recursos certamente serão interpostos pelos nobres defensores dessa cáfila de malfeitores, que precisam justificar seus régios honorários.

Depois de assembleias legislativas usarem a decisão do STF para livrar colegas de plenário da prisão antes mesmo da publicação do acórdão, alguns ministros questionaram a extensão da interpretação usada no caso de Aécio para beneficiar deputados estaduais. Caberá ao Supremo esclarecer se todo o Legislativo pode cometer crimes e ficar impune, ou se essa é uma prerrogativa exclusiva dos parlamentares federais ― por enquanto, pelo mesmo ralo onde passa um corrupto federal passam quadrilhas estaduais, oesgoto é o mesmo.

Observação: Nunca é demais lembrar que foi o vergonhoso e pusilânime voto de Minerva da ministra Cármen Lúcia que desempatou o placar o julgamento da tal ação direta de inconstitucionalidade, fazendo o fiel da balança apontar para o lado errado (na minha opinião, naturalmente, que certamente não é a mesma dos nossos caríssimos políticos).

Urge impedir que essa caterva de políticos moralmente putrefatos continue impondo sua imoralidade à sociedade brasileira, como fez com o neto de Tancredo e quase conseguiu fazer com o trio calafrio fluminense a partir de uma discussão “legalista” que só interessa aos advogados que ganham rios de dinheiro defendendo as quadrilhas com mandato. Lugar de corrupto é na cadeia, seja político ou não, tenha mandato parlamentar ou não.

Basta de foro privilegiado para ladrões de colarinho branco. Que sejam todos julgados pela mesma Justiça que investiga, processa, julga e pune de simples ladrões de galinha a empresários que se mancomunaram com políticos para roubar o suado dinheiro dos contribuintes. Cadeia neles! E Lula lá!    

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